terça-feira, 29 de abril de 2008
Of Life and Death
"Depois de algum tempo aprendes a diferença, a subtil diferença entre dar a mão e acorrentar uma alma. E aprendes que amar não significa apoiar-se, e que companhia nem sempre significa segurança. E começas a aprender que beijos não são contratos e presentes não são promessas. Acabas por aceitar as derrotas com a cabeça erguida e olhos adiante, com a graça de um adulto, e não com a tristeza de uma criança. E aprendes a construir todas as tuas estradas de hoje, porque o terreno do amanhã é incerto demais para os planos, e o futuro tem o costume de cair em meio ou em vão.
Depois de algum tempo aprendes que o sol queima se te expuseres a ele por muito tempo. Aprendes que não importa o quanto tu te importas, simplesmente porque algumas pessoas não se importam... E aceitas que apesar da bondade que reside numa pessoa, ela poderá ferir-te de vez em quando e precisas perdoá-la por isso. Aprendes que falar pode aliviar dores emocionais. Descobres que se leva anos para se construir a confiança e apenas segundos para destruí-la, e que poderás fazer coisas das quais te arrependerás para o resto da vida. Aprendes que verdadeiras amizades continuam a crescer mesmo a longas distâncias. E o que importa não é o que tens na vida, mas quem tens na vida. E que bons amigos são a família que nos permitiram escolher. Aprendes que não temos que mudar de amigos se compreendemos que os amigos mudam, percebes que o teu melhor amigo e tu podem fazer qualquer coisa, ou nada, e terem bons momentos juntos. Descobres que as pessoas com quem tu mais te importas são tiradas da tua vida muito depressa, por isso devemos sempre despedirmo-nos das pessoas que amamos com palavras amorosas, pode ser a última vez que as vemos. Aprendes que as circunstâncias e os ambientes têm influência sobre nós, mas nós somos responsáveis por nós mesmos.
Começas a aprender que não te deves comparar com os outros, mas com o melhor que podes ser. Descobres que se leva muito tempo para se controlar os nossos próprios actos ou eles te controlarão e que ser flexível nem sempre significa ser fraco ou não ter personalidade, pois não importa quão delicada e frágil seja uma situação existem sempre dois lados de uma questão.
Aprendes que heróis são pessoas que fizeram o que era necessário fazer, enfrentando as consequências. Aprendes que paciência requer muita prática. Descobres que algumas vezes a pessoa que esperas que te empurre, quando cais, é uma das poucas que te ajuda a levantar. Aprendes que maturidade tem mais a ver com os tipos de experiência que tiveste e o que aprendeste com elas do que com quantos aniversários já comemoraste. Aprendes que há mais dos teus pais em ti do que supunhas. Aprendes que nunca se deve dizer a uma criança que sonhos são disparates, poucas coisas são tão humilhantes e seria uma tragédia se ela acreditasse nisso. Aprendes que quando estás com raiva, tens o direito de estar com raiva, mas isso não te dá o direito de ser cruel. Descobres que só porque alguém não te ama da forma que desejas, não significa que esse alguém não te ama com tudo o que pode, pois existem pessoas que nos amam mas simplesmente não sabem como demonstrar ou viver isso.
Aprendes que nem sempre é suficiente ser perdoado por alguém, algumas vezes tens que aprender a perdoar-te a ti mesmo. Aprendes que com a mesma severidade com que julgas poderás ser em algum momento condenado. Aprendes que não importa em quantos pedaços o teu coração foi partido, o mundo não pára para que tu o consertes.
Aprendes que o tempo não é algo que possa voltar para trás. Portanto, planta o teu jardim e decora a tua alma, ao invés de esperares que alguém te traga flores. E aprendes que realmente podes suportar mais, que és realmente forte e que podes ir muito mais longe depois de pensar que não se pode mais. E que realmente a vida tem valor e que tu tens valor diante da vida! As nossas dádivas são traidoras e fazem-nos perder o bem que poderíamos conquistar, se não fosse o medo de tentar."
William Shakespeare
As razões do abismo
Os braços, sem medo, simulando o voo próximo,
Em bicos de pés, fingindo um equilíbrio que já não sei,
Todo o meu corpo balança à beira de um precipício que não procurei…
Considerando se devo ou não jogar-me
Considerando e calculando o tempo que demorará a queda de um corpo como o meu num buraco como estes
Considerando que depois de encontrar a solução da equação, pela prova dos nove, o resultado já não interessará mais
Considerando como será a sensação estranha do ar entrando-me àquela velocidade pelas narinas
Considerando se hei-de ou não fechar os olhos, durante a viagem
Considerando se hei-de ou não descalçar os sapatos, no degrau derradeiro
Considerando que posição majestosa adoptar no sublime mergulho para a eternidade
Considerando, medicalmente, se o meu coração aguentará a pressão da alta dose de adrenalina e de stress que me correrá pelas veias arrepiadas
Considerando, cientificamente, se o meu cérebro se extinguirá ao adivinhar o seu extermínio
Considerando se estarei lúcido no instante antes do impacto
Considerando, pseudo-intelectualmente, no que pensarei no último segundo
Considerando, psico-freudiamente, no que me atravessará o espírito nesse momento final
Considerando o aspecto pouco agradável que terá o meu monte de carne desfeita lá em baixo
Considerando que, pelo menos, os abutres apreciarão
Considerando que, pelo menos assim, servi para alguma coisa
Considerando que já não faço falta cá em cima
Considerando que nunca fiz falta
Considerando que fui um erro da Natureza
Considerando que só assim posso emendar o que Deus errou
Considerando que só assim me salvo de tudo isto
Considerando que só assim escapo ao meu destino
Considerando que só este será um acto que eu terei verdadeiramente decidido
Considerando que está na altura de ser eu a tomar este tipo de decisões, mesmo se é a última
Considerando que, com a minha partida, não se perderá grande coisa
Considerando que ninguém perderá grande coisa
Considerando que até podem, momentaneamente, sentir a minha falta
Considerando que isso depressa lhes passará, ao recordarem o meu mau génio
Considerando que não sou nem nunca fui indispensável a ninguém
Considerando que até o Ozono e a Floresta Amazónica ganharão em eu partir
Considerando que toda a gente passará melhor sem mim
Considerando que o Universo é perfeitamente viável sem mim
Considerando que até o Futuro, - não o meu –, será mais promissor assim
Considerando que só chateio, entristeço, estorvo, atrapalho, empato-fodas
Considerando que, assim, até eu próprio, já não terei de me aturar mais
Considerando que, assim, já não precisarei fingir
Considerando que, assim, já não poderei sentir
Considerando que, assim, já não poderei me dar
Considerando que, assim, já não me deixarei apaixonar
Considerando que, assim, já não poderei desiludir-me
Considerando que, assim, já não não poderão atingir-me
Considerando que, assim, já não sofrerei
Considerando que, assim, já não chorarei
Considerando que tudo continuará, no melhor dos Mundos, sem mim
Considerando, finalmente, que vim apenas para partir assim.
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Recordando um poema de 2002. As coisas, hoje, felizmente mudaram.
sexta-feira, 25 de abril de 2008
quarta-feira, 23 de abril de 2008
valter hugo mãe, "tsunami" da língua
e da literatura portuguesas
valter hugo mãe, vencedor do prémio saramago 2007 esteve este fim-de-semana no luxemburgo para participar na primavera dos poetas. o contacto conversou com aquele que o nobel da literatura 1998 qualifica de "tsunami" da língua e da literatura portuguesas.
chama-se valter hugo lemos mas escolheu o pseudónimo literário valter hugo mãe, assim mesmo, grafado em minúsculas, que é o que não só distingue como define a sua escrita (ver caixilho), seja na poesia, pela qual começou nestas lides ainda adolescente, ou na prosa, à qual quer dedicar cada vez mais espaço e tempo.
com apenas 36 anos tem já mais de uma dezena de livros de poesia e dois romances publicados, "o nosso reino" (temas e debates, 2004) e "o remorso de baltazar serapião" (quid novi, 2006), tendo-lhe valido este último o prestigiado prémio literário josé saramago 2007.
"este livro é um tsunami, não no sentido destrutivo, mas da força. (...) quando foi publicado? e os sismógrafos não deram por nada? oh, que terra insensível: este livro é uma revolução. tem de ser lido, porque traz muito de novo e fertilizará a literatura. por vezes tive a sensação de estar a assistir a um novo parto da língua portuguesa", foram as palavras do próprio josé saramago (prémio nobel da literatura 1998) ao ler o livro.
"sem ser um romance histórico, a acção de baltazar serapião decorre na idade média e fala sobre machismo, sexo e violência, numa língua que se quer rude sem ter sido estudada para ser fiel à que se falava na época. mas a própria forma como a acção é contada faz com que o vocabulário e a construção frásica acabem por ser personagens do livro, ao mesmo título que os protagonistas", explica o autor.
apesar de já ter recebido o prémio garrett em 1999, talvez tenha sido o prémio saramago que o tornou mais conhecido junto do grande público. o poeta era, no entanto, já um nome confirmado no mundo literário e editorial português, tendo sido fundador das editoras quasi (com jorge reis-sá) e objecto cardíaco, projectos que entretanto abandonou.
foi aproveitando essa notoriedade recente que o instituto camões do luxemburgo resolveu convidar o jovem para representar portugal na primavera dos poetas que o grão-ducado acolheu durante o fim de semana.
depois dos rasgados elogios do prémio nobel e da crítica, entre os quais vasco graça moura, que o compara a guimarães rosa, o jovem confiou ao nosso jornal ter ficado "emudecido" com esse reconhecimento. vencer o prémio saramago foi algo de "avassalador", confessa, até porque escolheu viver em vila do conde, longe dos grandes centros urbanos e diz não estar habituado a que se "lembrem" dele. mas, garante, não tem medo das responsabilidades, embora se questione "como fazer para impressionar essa gente toda outra vez". talvez com um novo romance?
o novo romance sobre a imigração e a estreia como cantor
previsto para outubro e tendo como palco bragança, o novo livro de valter hugo mãe "conta a história de um imigrante ucraniano em terras lusas e como este é alvo de discriminação pelos portugueses", revelou o autor ao contacto. ainda sem título, a obra pretende-se uma crítica ao facto de um país de emigração como portugal ter dificuldades em lidar com os seus imigrantes.
grande fã de adolfo luxúria canibal, vocalista dos mão morta, valter hugo mãe está actualmente a gravar um álbum de "jazz-fado-blues", como o próprio conta, com dois elementos daquela banda, na sua primeira incursão como cantor. a saída do álbum está prevista também para outubro com a chancela da editora cobra. Como letrista, valter hugo mãe havia já trabalhado com paulo praça (artista vila-condense), e recentemente chegaram-lhe convites de rui reininho (líder dos gnr), pedro abrunhosa, mundo cão e frei fado d'el rei, o que o está a entusiasmar muito.
na primavera dos poetas, valter hugo mãe também mostrou esses seus dotes musicais. após dizer poemas seus, alguns dos quais do seu último livro de peosia, "pornografia erudita" (cosmorama, 2007), improvisou um excerto de uma canção dos madredeus, mostrando ser dono de um voz forte e lírica, o que lhe valeu a admiração e o espanto do público presente, que não esperava, de todo, a "actuação" expontâna.
entretanto, parece que tudo está a acontecer na vida do autor e as cosmorama edições preparam-se para editar em breve uma recolha com toda a sua poesia (incluindo "bruno", que teve apenas edição em espanha).
os curiosos ou os fãs podem consultar o seu blogue em http://casadeosso.blogspot.com/ ou descobrir mais sobre o autor no seu site oficial, em www.valterhugomae.com/, na internet.
abaixo as maiúsculas
durante a entrevista com o poeta e escritor português valter hugo mãe, que esteve no luxemburgo, para participar na primavera dos poetas, durante o passado fim de semana (ver artigo principal) interpelámos o autor sobre as minúsculas omnipresentes na sua escrita.
negando cultivar "a diferença pela diferença", de ir em movimentos de moda ou de o fazer apenas para provocar, o autor confia "detestar" maiúsculas.
"escrevo em minúsculas porque acredito que o meu texto adquire uma tonalidade diferente. coloco numa mesma dignidade e paridade todas as palavras. abdico da convenção prévia de acentuar algumas delas através da maiúscula, elimino essa discriminação. em qualquer obra literária a importância relativa das palavras é afinal decidida pelo leitor. além disso, as minúsculas aceleram a leitura, e na minha narrativa que já é acelerada, é interessante deixar o leitor sem travões", explicou.
josé luís correia
(in jornal "contacto", 23.04.08)
sábado, 19 de abril de 2008
Daqui desta nascente
que é o princípio e o fim de tudo
o alfa e o ómega dos meus sorrisos e do meu sopro
ponto cardeal que me guia e desnorteia
rosa-dos-ventos dos meus sentidos
rosa que desabrocha quando a beijo com a boca
onde sorvo o orvalho doce da manhã que nasce
Vejo matas mansas, dunas erguidas, colinas oprimidas, vulcões em convulsão
e rios desenfreados procurando o mar na minha mão
avisto terras prometidas e rotas de sedas e especiarias
equadores e hemisférios e os paralelos do teu corpo
latitudes latentes que aguardam os meus gestos
E as estrelas eclipsando velhos mundos mortos
a via láctea deleitando-se na almofada branca
as clepsidras segurando o tempo infinito
e tu nos meus braços, encorajando o meu rosto.
Todo o céu se abre num estrondoso vacarme
e o mar desencadeado quer levar-me
sem que eu peça
Para onde tudo acaba e sempre recomeça.
Desta vez, o deserto não há-de vencer,
não há-de engolir-me os pulmões com pó.
O que foi depois daquela tempestade,
quando o rio desfez o convés antes de chegar à foz?
Já não queria lembra-me desse dia de mau augúrio,
o apóstolo mentiu, o fim do mundo voltou.
Avisto da torre de vigia,
as nuvens negras do juízo final
engordarem o céu ao horizonte
e anunciarem a trovoada.
Vale a pena enfunar as velas para salvar o navio?,
ele já viu tantas!
Hoje não sinto medo,
eu sabia que este dia ia chegar,
os meus dedos impávidos ainda cheiram a sangue e pólvora,
fiz demasiado mal para me safar daqui assim,
desta vez é a minha vez.
A onda de choque não me há-de arrancar do chão,
fecho as goelas ao maremoto, os olhos ao tufão,
a electricidade há-de correr-me o corpo,
e eu hei-de ficar de pé,
rindo patibular dos meus algozes e carrascos,
mesmo se a multidão em delírio de espectáculo,
já não escutar as minhas derradeiras palavras:
"25 men on a dead man's chest,
yo ho ho and a bottle of rum!..."
Tenho sede, mas nem o céu há-de vir em meu auxílio.
quando a espada te atravessa tão repentinamente, ainda a sentes?
quando o punhal foi tão fundo que tu já não sabes se é dor que desatina sem doer, ainda é golpe?
quando o sangue te escorre das mãos e ainda está quente, ainda é teu?
quando já não ouves o estrondo do tiro e vês o buraco negro no teu peito fumegante, é a altura certa para saberes que deves morrer?
quando a queimada devasta mais uma vez a terra e ela já não é combustível, o que mais há para arder?
quando perdes pé e sabes que o mar te vai encher as goelas e as narinas e as órbitas dos olhos, ainda estás vivo para pensar nisso tudo?
quando o deserto te queima os pulmões com pó, ainda tens sede?
quando passas a voar pelo 10° andar a caminho do solo, ainda sentes as tuas veias a pulsar arrepiadas?
quando te desintegras num só sopro de explosão, para onde vais?
quando o sol fica negro e já não é dia nem é noite, onde estás?
quando todos te dizem que és um monstro, deves continuar a viver?
docilmente, ajoelhas-te perante os teus carrascos,
de olhos bem abertos vês a verdade nos seus,
deitas a cabeça no madeiro,
entregas a nuca nua à justiça,
a multidão em delírio cala-se ofegante,
o céu respira uma, duas vezes,
durante uns breves instantes tens a sensação que consegues ouvir o sol a arder.
De repente já não ouves, não sentes nada.
A mão do anjo veio intervir por ti e paralisou o derradeiro momento?
Já podes levantar os olhos?
Se o teu sangue não escorre à tua volta, é bom sinal?
Quando já não há multidâo, nem gume, nem céu,
e o sol ficou como bréu e já não é dia nem é noite, onde estás?
desfazer os teus cabelos por sobre os teus tímidos seios
forrar o teu peito sedento de beijos molhados
lamber o sal do teu corpo até à última gota de suor
devorar a tua língua e os teus lábios de menina
mergulhar os teus olhos negros no meu ventre em fogo
penetrar-te docemente como um pôr-do-sol fendendo o mar
[ que se deixa fecundar pela luz
morder os teus ombros alvos de tanto te querer
elevar-te ao mais alto altar do meu corpo
conter os teus espasmos nos meus braços
oferecer-te a minha alma nua como a nenhuma outra mulher.
o homem do café
O homem de óculos e bigode, sentado de perna magra cruzada, bebe café. As suas mãos recusam o açúcar e correm nervosamente o tampo da mesa em madeira antiga. Ajeita o colarinho ensopado em suor, olha-se no espelho do bar, alisa o fato amarrotado e o cabelo em batalha. Parece querer erguer-se e sair, mas permanence sentado.
Os seus olhos colidem com os meus. Espero que seja ele a desviar o olhar, intimidado no seu acto de me observar. Finalmente, baixo eu os olhos, para dissolver o açúcar no meu café. Mas, quando lá volto, o gajo ainda está a olhar para mim. Perscruta-me, como se o seu itinerário apenas dependesse de mim. Não estou para aturar isto. Quem é que ele pensa que é. Vou lá. Enfrento-o e digo-lhe: "Vai!"
Fita-me, como se não entendesse, um nada preocupado, e encolhe os ombros. "Vai!", quase grito, fosse ele surdo. "Vai, sai daqui, estás à espera de quê?"
Ele sorri de braços bambos e encolhe os ombros novamente. Acha-me graça, o idiota?
Enfureço. Chego-me a ele, pego-lhe num braço violentamente, levanto-o como uma marioneta e arrasto-o até à porta. "Vá, sai. Põe-te daqui para fora…".
Prescruta-me intrigado. Sem animosidade, com ar de asno, fica especado na soleira da porta olhando-me. Olhos nos olhos, sinto uma tontura, como se ele me possuisse. De onde está, sem se mover, puxou-me até ao seu lugar. Como se me sugasse. Não é humano. Desincorpora-se. Transfigura-se. Olho-o mas já não sei que vejo. A mim. Clonou-me? É como um espelho?
Reconheço-me enfim. Esse palerma esquizófrénico sou eu. Sou eu, violentando-me para me extrair de mim mesmo, para ir apanhar ar lá fora, fora de mim, trazer oxigénio fresco, regenerado, cá para dentro, para esta taverna com cheiro a mofo, este antro soterrado em banalidades e inépcias, este ventre pantanoso e estéril donde não consigo atingir a luz, de onde grito mudo. Naufrago em placenta, estrangulo-me com o meu próprio cordão umbilical, afogo-me, sufoco em mim… Preciso nascer, explodir!
sexta-feira, 18 de abril de 2008
O que estou a ler / Ce que je suis en train de lire:
"Bad Monkeys", de Matt Ruff: toda e qualquer semelhança com um universo paralelo ao nosso é, evidentemente, pura coincidência.
Depois, conto mais.
porque te amo?
Estás sempre a perguntar,
"Sabes Zé, porque me amas?"
Se eu não soubesse, meu amor,
Ia já comprar um coração novo, porque é ele, o
Coração, que sabe porque te
Amo tanto assim.
...amo-te por seres o meu acordar mais delicioso,
o meu abraço mais carinhoso
porque me sorris em cada olhar
como o céu que se espelha no mar
porque a carícia é o teu último gesto antes de adormeceres
porque a tua mão procura a minha durante a noite sem saberes
e o teu corpo se cola ao meu como se a Terra assim girasse
amo-te por seres o sol e a lua
que nunca minguasse
por seres o meu desejo de sempre te ver nua
entre as minhas mãos e no meu peito
por seres assim desse teu jeito
e tudo o mais e todas razões sem razão
que o meu pobre coração
ignora, e por aí fora...
quinta-feira, 17 de abril de 2008
Diz-me, Amor
onde estão o Afonso, a Inês, o Telmo e o Samuel
os quatro cavaleiros de génio do meu genesis
e o professor, o astronauta, o arquitecto,
o balde de legos, o carnaval dos pobres,
e todo o rancho da minha infância de redoma
e todo o séquito de heróis dos mundos que me inventei
transviei-me nas viagens que não fiz
nem pelo equador nem pela via láctea,
nem pelo meu quarto?...
Onde paira o marinheiro do Ó
para que lado fica o crespúsculo no montado deitado
o apartamento novo de grandes janelas indiscretas
que deixavam o sol penetrar o teu vestido
onde estão as tuas canções, as promessas vãs,
o futuro do fruto do teu ventre bom
hoje são estrume amontoado pelo chão
folhas velhas que aprodeceram
no paço vazio e sombrio do meu Outono temporão?
Diz-me amor,
se o Amor é como os figos
doce, frágil, colorido e pegajoso
mas que não consegues parar de comer
lambuzando mãos, lábios, queixo e tudo
mas pedes mais e nunca te sentes enfastiado?
Diz-me Amor,
porque me falas das mulheres que me desejam
se me lembro apenas das que me traíram,
efeitos secundários da brisa que já sopra do Lethes?
JLC
quarta-feira, 16 de abril de 2008
valter hugo mãe no burgo
o poeta, romancista e editor (da ed. objecto cardíaco) valter hugo mãe (o autor costuma grafar o seu nome em minúsculas e assim deve ser respeitado) vai estar no luxemburgo no âmbito da quarta edição luxemburguesa da primavera dos poetas, que decorre de 18 a 21 de abril.
além de encontros com alunos da escola europeia, o poeta vai estar
sexta-feira, a partir das 19h, na fundação da arquitectura, em hollerich;
sábado, a partir das 20h, na abadia de neumünster, no grund;
a primavera dos poetas conta este ano com a presença de mais duas dezenas de autores vindos dos quatros cantos da europa.
(foto extraída, com a devida vénia, do site do fotógrafo nelson d'aires)
Estudo sobre os altos rendimentos no Luxemburgo revela
Cerca de 10 % dos habitantes do Luxemburgo têm rendimentos anuais que ultrapassam, em média, os 56.280 euros, segundo um estudo recente do Centro de Estudos das Populações, Pobreza e Políticas Sócio-Económicas do Luxemburgo (CEPS/Instead).
Por categoria profissional, estes altos rendimentos pertencem a, por ordem decrescente: funcionários europeus e de outras instituições internacionais (35 %); funcionários públicos luxemburgueses (20 %); independentes (16 %); e "employés privés", ou empregados por conta de outrem (14 %).
Por nacionalidade, são os cidadãos da União Europeia os que dispõem, na sua grande maioria, dos mais altos rendimentos do país. A grande excepção são os portugueses e os italianos, tendo em conta a sua sobre-representatividade no resto da população com ordenados baixos e médios relativamente aos dos funcionários europeus dessas nacionalidades. Os luxemburgueses estão representados timidamente nos altos rendimentos, mas constituem a grande maioria da classe média superior, mostra o estudo.
A maioria dos altos rendimentos pertencem a pessoas com idades compreendidas entre os 50 e os 65 anos, no auge ou praticamente no término da sua carreira profissional, e que residem, maioritariamente (60 %), na capital ou em Capellen, onde o preço dos terrenos e das habitações também são os mais elevados, quando apenas 30 % da população total do país reside nesses cantões (distritos). Inversamente, o cantão de Esch/Alzette, que reagrupa 34 % da população total, conta apenas 16 % de moradores com rendimentos altos.
Os rendimentos da maior parte das pessoas consideradas "ricas" provêm de um trabalho remunerado. São 75 % neste caso. Os restantes "afortunados" têm rendimentos pessoais que provêm de investimentos (5 %), transferências privadas (1 %) e reformas ou pensões (11 %).
Ainda segundo o CEPS/Instead, os 10 % mais ricos do Luxemburgo auferem ordenados ou dispõem de rendimentos três vezes e meia superiores aos 10 % mais pobres.
Os rendimentos das pessoas mais pobres do país rondam os 16.100 euros/ano, enquanto a maior parte da população tem, em média, rendimentos que chegam aos 29.680 euros anuais, 1,8 vezes superior aos rendimentos mais modestos.
Mais estudos = melhor ordenado
José Luís Correia (in Contacto, 16.04.08)
terça-feira, 15 de abril de 2008
segunda-feira, 14 de abril de 2008
Autor do "Arrastão" passou pelo Grund
(foto do site Fórum Nacional)
domingo, 13 de abril de 2008
a execução das lâmpadas
Instruções:
Todas as outras constantes subtraem-se à variável
mas não como o núcleo do potássio instável
que se reduz à curva que declina e ao produto que elimina.
Modo:
Fuzilo o carbono
executo as lâmpadas
e acarianos penetrantes
escavam a minha pele.
Terra de mim mesmo em ocioso
pousio claudicante
o verbo é um músculo perigoso
navalha, cicuta no meu sangue.
Sabre oxidado e torto
giz desmoronado em pó
barro quadrado e morto
cem metros dominó.
Vértice desfocada, lente obnubilada
traço descontínuo fora de mão
no sublime firmamento da razão
a simplicidade seria dizer:
não sei escrever!
sábado, 12 de abril de 2008
Un crépuscule de juillet. Il pleut comme à la fin du monde.
J’expérimente les eaux et le froid sur mon corps.
De petites mers se déversent en de grandes gorgées dans le caniveau,
le vent fuit les impasses, le tonnerre traverse le ciel hanté et moi ma vie.
Si tu étais ici maintenant, me sentirais-je plus heureux ?
Si tu m’enlaçais en cette heure, aurais-je encore peur ?
Le ciel impénétrable oublie le monde trempé…
Et toi, où es-tu ? Enroulée dans ton gilet en laine, lisant mon livre, à la lumière de l’abat-jour ? As-tu déjà écouté l’eau ?
L’océan s’ouvre à l’envers et chaque goutte cherche le sol comme le salut,
têtes penchées les arbres nettoient lourdement leur visage sur l’asphalte,
des silhouettes dans la pénombre passent comme des fantômes à mes pieds.
Sans défense sous la pluie, le vent cherche mon échine,
la voûte céleste se déchire
sur mes tempes, chaque goutte qui m’atteint à quelle vitesse tombe-t-elle,
à quelle vitesse explose-t-elle sur ma peau ?
La douleur, après le cri. Le nef céleste se tord en convulsion,
une clarté fugace rompt l’arc. Ce n’est pas Dieu agacé,
ne sont pas les nuages qui se décharge, ce n’est pas le cycle se perpétuant.
C’est le ciel voulant se voir, comme Narcisse, au miroir.
Moi aussi, j’ai découvert le chemin me menant vers toi.
Je ne me suis tout simplement pas encore décidé à la prendre.
sexta-feira, 11 de abril de 2008
pOESIA pUNK
é como limpar o cu sem estar cagado
é como um punk a cantar o fado
é como um hippie vestido de soldado
é como rir das piadas do Solnado
é como o isqueiro não acender depois do charro enrolado
é como uma pedrada que bate no momento errado
é como um frasco de absinto despejado
é como a falta de tesão quando a gaja te está chupar o nabo
é como foder o rabo de uma betinha com agrado
é como a merda da poesia quando não rima com nada.
Autor: Zé Tatoo Do Pedrado (aka. A.G. Weytjens)
quinta-feira, 10 de abril de 2008
Ensaio sobre a lucidez (ou: o Richard e eu)
O Richard Gere e eu concordamos em pelo menos três coisas: a autonomia do Tibete, uma atracção certa pela Kelly McGillis e por mulheres que usam chapéu. É preciso aceitar que até os simples de espírito têm direito ao seu quarto de hora de lucidez. Aos tolos pertence o reino dos céus, não é já o que ensinava o pai do teatro português, Gil Vicente, no princípio do século XVI? Eu sempre disse que preferia as caves de Dante, onde vão parar todas as gajas boas. Até nisso, o nosso Gil tinha razão. Talvez eu lá encontre a alcoviteira ou a namoradinha do frade espadachim. Ou a Kelly, se tiver mais sorte. A minha eternidade promete ser quente... sobretudo se o Richard não tiver por perto. Não, não é "inbeja"! É lucidez.
quarta-feira, 9 de abril de 2008
Un petit slam de Grand Corps Malade
En fait, ça fait un moment que se croisent dans ma tête
Des mots et des douceurs qui pourraient faire un texte
Un truc un peu différent, je crois que ça parlerait d'elle
Faut avouer que dans mon quotidien, elle a mis un beau bordel
Mais j'ai un gros souci, j'ai peur que mes potes se marrent
Qu'ils me disent que je m'affiche, qu'ils me traitent de canard
C'est cette pudeur misogyne, croire que la fierté part en fumée
Quand t'ouvres un peu ton coeur, mais moi cette fois je veux assumer
J'ai un autre problème, il est peut-être encore plus lourd
C'est que t'as pas droit à l'erreur quand t'écris un texte d'amour
Moi, les trois prochains couplets, je voudraient que ça soit des bombes
Si j'écris un texte sur elle, je voudrais que ça soit le plus beau du monde
Elle mérite pas un texte moyen, j'ai la pression, ça craint
Fini de faire l'intéressant, avec mes voyages en train
Là c'est loin d'être évident, moi je sais pas comment on fait
Pour décrire ses sentiments, quand on vit avec une fée
Il faut avouer qu'elle a des yeux, ils sont même pas homologués
Des fois ils sont verts, des fois jaunes, je crois même que la nuit ils sont violets
Quand je m'enfonce dans son regard, je perds le la je n'touche plus le sol
Je me perds profondément, et j'oublie exprès ma boussole
Depuis que je la connais, je ressens des trucs hallucinants
Je me dis souvent que j'ai eu de la chance de lui avoir plu, sinon
J'aurais jamai su qu'un rire pouvait arrêter la Terre de tourner
J'aurais jamais su qu'un regard pouvait habiller mes journées
Je comprends pas tout ce qui se passe, y a pleins de trucs incohérents
Depuis qu'elle est là rien n'a changé, mais tout est différent
Elle m'apporte trop de désordre, et tellement de stabilité
Ce que je préfère c'est sa force, mais le mieux c'est sa fragilité
Ce n'est pas un texte de plus, ce n'est pas juste un poème
Parfois elle aime mes mots, mais cette fois c'est elle que mes mots aiment
Je l'ai dans la tête comme une mélodie, alors mes envies dansent
Dans notre histoire rien n'est écrit, mais tout sonne comme une évidence
J'ai redécouvert comme ça réchauffe d'avoir des sentiments
Mais si tu me dis que c'est beaucoup mieux de vivre sans, tu mens
Alors je les mets en mots et tant pis si mes potes me chambrent
Moi je m'en fous, chez moi y a une sirène qui dort dns ma chambre
J'avais une vie de chat sauvage, elle l'a réduite en cendres
J'ai découvert un bonheur tout simple, c'est juste qu'on aime être ensemble
On ne calcule pas les démons du passé, on n'a pas peur d'eux
Moi si un jour j'suis un couple, je voudrais être nous deux
Y a des sourires et des soupires, y a des fou rires à en mourir
On peut s'ouvrir et s'en rougir, déjà se nourrir de nos souvenirs
Les pièges de l'avenir nous attendent, mais on n'a pas peur d'eux
Moi si un jour j'suis un couple, je voudrais être nous deux
Et si c'est vrai que les mots sont la voix de l'émotion
Les miens prennent la parole pour nous montrer sa direction
J'ai quitté le quai pour un train spécial, un TGV palace
On roule à 1000km/h, au dessus de la mer, en première classe
Et si c'est vrai que les mots sont la voix de l'émotion
Les miens prennent la parole pour nous montrer sa direction
J'ai quitté le quai pour un train spécial, un TGV palace
On roule à 1000km/h, au dessus de la mer, en première classe.
"Evidence", de Grand Corps Malade, extrait de l'album "Enfant de la ville". J'adore cet artiste et son dernier album.
sexta-feira, 4 de abril de 2008
quarta-feira, 2 de abril de 2008
Belvalplaza 1: contra-relógio até 1 de Outubro
Esch-Belval vai ter complexo
comercial e habitacional único no país
comercial e habitacional único no país
O novo bairro de Belval está a crescer a grande velocidade entre Esch e Belvaux. Após a Rockhal e o edifício-sede da Dexia-BIL, a próxima grande estrutura a ser inaugurada é o complexo habitacional e comercial Belvalplaza 1 , a 1 de Outubro.
Concluir a construção da "Porte de France" (Porta de França), a avenida de Belval que ficará por cima daquilo que ainda hoje é um gigantesco buraco vazio junto ao túnel que ligará Esch/Alzette à localidade francesa de Micheville, antes de 1 de Outubro, dia da inauguração oficial do centro comercial e habitacional Belvalplaza 1, é o desafio que se coloca aos construtores e promotores do projecto.
No local existe aliás um relógio que conta os dias e as horas que faltam até à grande inauguração.
O complexo Belvalplaza 1 (B1), situado ao lado da Rockhal, dispõe de 91 apartamentos, restando pouco mais de dezena e meia à venda, com preços que variam entre os 185 mil euros para apartamentos com 53m2 e os 350 mil euros para os que têm 94m2. Já o Belvalplaza 2 (B2) abrigará 200 apartamentos e "lofts" que variam entre 25 e 150m2 e cuja pré-venda começa no próximo dia 7 de Abril.
Projectados para lançar no Luxemburgo um novo conceito urbano de habitação, que mistura zona residencial e comercial no mesmo edifício, o B1 e B2 contam na sua globalidade igualmente com um espaço comercial para cerca de 70 lojas.
70 LOJAS E O MAIOR CINEMA DO PAÍS
O grupo alemão de distribuição de produtos electrónicos Media Markt, a livraria Ernster, a sapataria Eden Shoes, a perfumaria Paris XL, as ópticas Pearle Vision (que acabam de comprar as lojas da Optique Steffen) e Alain Afflelou, a loja de acessórios de moda Véritas, o Café Illy, o bar Autre Part ou o salão de cabeleireiros luso-luxemburguês T&M serão outros dos locatários. A T&M disporá igualmente de uma segunda loja no B2.
O B1 acolherá igualmente o complexo cinematográfico do grupo Caramba: sete salas com capacidade para 1.400 espectadores, uma das quais será a maior do país com 615 lugares, prevista, segundo anunciaram os responsáveis, "para as grandes estreias".
O subterrâneo do B1 terá ainda um parque de estacionamento para 1.600 automóveis.
Enquanto o B1 é inaugurado a 1 de Outubro, o B2 deverá estar pronto seis meses depois, na Primavera de 2009. Para o B2 está já prevista a instalação de uma cervejaria "à francesa" e um supermercado com 3.000m2 do grupo belga Delhaize.
UM BAIRRO A CRESCER
O túnel, baptizado "Central Gate", que ligará a A4 a Micheville, está a ser escavado sob as vias férreas, sem provocar a menor interferência no tráfico ferroviário entre Esch e Belval, numa operação de engenharia civil sem precedentes na história do Luxemburgo, já elogiada pelo ministro das Obras Públicas, Claude Wiseler, que esteve a 13 de Março no local das obras.
Do lado de lá da fronteira, as autoridades comunais francesas aguardam a "luz verde" e o orçamento apropriado do Governo francês para ligarem a rede rodoviária lorena à luxemburguesa.
Entre o B1 e o edifício-sede da Dexia, os altos fornos vão transformar-se em museu para acolher o Centro Nacional da Cultura Industrial (CNCI). Nas imediações ficará o Belval Square, uma zona mista com lojas e habitações que deverá incluir um hotel, mas também o novo edifício dos arquivos do Estado (29 mil m2), além de um edifício administrativo público (6 mil m2), o novo liceu, uma escola primária e as faculdades. Na zona norte, ficará a zona habitacional "Square Mile" e a zona verde do parque de Belval. Prevê-se que em 2013 o novo bairro de Belval conte 6 mil moradores e 25 mil trabalhadores.
José Luís Correia (in Contacto, 02.04.08)