quinta-feira, 26 de janeiro de 2012
quarta-feira, 25 de janeiro de 2012
Pessoa: As ideias, as sensações, a sociedade e arte
(...) As sociedades são conduzidas por agitadores de sentimentos, não por agitadores de ideias. Nenhum filósofo fez caminho senão porque serviu, em todo ou em parte, uma religião, uma política ou outro qualquer modo social do sentimento.
Se a obra de investigação, em matéria social, é portanto socialmente inútil, salvo como arte e no que contiver de arte, mais vale empregar o que em nós haja de esforço em fazer arte, do que em fazer meia arte. (...)"
Fernando Pessoa,
(Notas Autobiográficas e de Autognose)
Se a obra de investigação, em matéria social, é portanto socialmente inútil, salvo como arte e no que contiver de arte, mais vale empregar o que em nós haja de esforço em fazer arte, do que em fazer meia arte. (...)"
Fernando Pessoa,
(Notas Autobiográficas e de Autognose)
sexta-feira, 6 de janeiro de 2012
E se o Luxemburgo desaparecesse?
Tudo porque as instituições europeias desertaram o Luxemburgo, o que provocou a eclosão da bolha imobiliária e o aumento do desemprego para mais de 25 % no país. A única salvação do Grão-Ducado, acreditam estes activistas, é o Luxemburgo tornar-se a capital de um novo território, a Grande Região, numa espécie de "Império Europeu do Meio", que é um velho sonho medieval de uma grande Borgonha unida.
No romance "2129-Chasse à l'homme de l'art" (Éditions de l'officine), Enrico Lunghi imagina, no séc. XXII, um Grão-Ducado desmembrado, fazendo parte da província SarreLorLux.
Na capital grã-ducal, a Gëlle Fra foi substituída por uma estátua de Juncker, e apenas os funcionários públicos ainda falam luxemburguês. O centro da capital tornou-se uma kasbah multirracial, onde se fala mandarim, hindi e ... português. No Kirchberg, Pedro, um milionário ermita português, transformou o Mudam em palácio privado, de onde observa e manda na cidade, como se fosse o seu feudo reservado.
José Luís Correia
(in Point24-edição portuguesa, de 06/01/2012)
terça-feira, 3 de janeiro de 2012
A década de euro, e agora ?
Há exactamente 10 anos guardei os francos luxemburgueses, franceses, belgas, os marcos, as pesetas e os escudos numa gaveta, saí eufórico e fui atestar o meu carro com euros pela primeira vez. O gasóleo custava então 0,7 euros. Dez anos volvidos, vale a pena eu continuar a ser um euro-optimista?
Quando hoje criticamos o euro pela subida dos preços, um aumento atestado por todos os estudos feitos sobre o assunto, esquecemos o positivo que a moeda única trouxe.
Nunca mais tivemos que transportar meia-dúzia de porta-moedas com diferentes divisas ao viajar pela Europa, nem nunca mais fomos « roubados » no câmbio. Câmbio, aí está uma palavra que não digo há muito. Fazer parte da união económica e monetária protegeu-nos também da onda de choque da crise financeira de 2008, que chegou até nós, sim, mas muito mais tarde e já menos devastadora. Pertencermos ao euro permitiu também manter as taxas de juro baixas até 2010 e 2011, em certos países da zona euro, e isto apesar da crise.
Não esqueçamos também o prestígio que a nossa moeda comum adquiriu nos mercados internacionais, graças ao seu equilíbrio e ao peso político da Europa. Hoje o euro está ligado a 42 países do mundo : os 17 países da zona euro ; os seis estados europeus não-comunitários que adoptaram o euro como moeda principal ou segunda moeda nacional ; e 19 países africanos (entre eles, Cabo Verde) e do Pacífico, que ligaram a sua moeda ao euro. O sucesso do euro fez até com que seis países do Golfo Pérsico se pusessem a pensar em criar uma moeda comum, que os libertasse do « dólar ».
Mas, passada a década de e(o)uro dos anos dois mil, a nossa moeda enfrenta agora, no início dos anos dez, uma grande crise, a « Grande Recessão », como lhe chamam já alguns economistas. A forma como vai ser resolvida esta crise, nos próximos meses e anos, vai reforçar ou fragilizar irremediavelmente a UE. O presidente do Eurogrupo, Jean-Claude Juncker, bem o clama : « A crise não é do euro, é de países como Portugal e Grécia », e é para esse problema que é preciso encontrar uma solução.
Há os que são apologistas da « solução islandesa ». A Islândia, que viveu a falência do Estado em 2008, conseguiu reerguer-se, após três anos de rigor. Num momento em que a UE enfrenta 2012 ainda em recessão, a pequena ilha aponta para um crescimento económico de 3%. Qual é o milagre de Reykjavik ? O Estado islandês decidiu não salvar os bancos em crise, exactamente o contrário do que fez a UE. Melhor, o Estado islandês decidiu não salvar os accionistas, mas proteger os clientes. Mas fazer isso a nível europeu teria um efeito de contágio entre bancos, o que só contribuiria para alastrar ainda mais a crise.
Para escapar à crise da zona euro, há países que já equacionaram abandonar o euro e voltar às suas antigas moedas fortes nacionais, para se protegerem das turbulências dentro da eurozona . Outros falam em expulsar do grupo os maus alunos, como Atenas e Lisboa, e os que se seguirem. É a proposta Merkozy. Economistas como Barry Eichengreen (“The Breakup of the Euro Area », 2007), da Universidade de Berkeley, ou Michel Dévoluy (« L’euro est-il un échec ? », 2011), da Universidade de Estrasburgo, imaginaram o que poderia suceder se isso viesse a acontecer e ambos afirmam que a saída forçada do euro teria consequências nefastas para um estado-membro, mas também para a UE.
Quer seja a Grécia, Portugal ou outro país, regressar, neste contexto de crise, à moeda nacional significaria forçosamente desvalorizar a divisa, e viver-se-ia uma corrida desenfreada aos bancos por parte dos clientes, que não quereriam perder poder de compra. O que poderia conduzir à fragilização ou mesmo à falência de alguns bancos. Acrescente-se a isso uma forte inflação, fuga dos investidores, aumento das taxas de juro. Se a dívida fosse reestruturada (como fez a Argentina em 2002), por forma a que 1 euro passasse a valer, por exemplo, 20 escudos, em vez de 200 (fosse isso sequer possível !), a medida poderia parecer benéfica para o país, num primeiro tempo, porque diminuiria artificialmente a dívida, mas custar-lhe-ia a credibilidade junto dos mercados financeiros, e a economia sofreria uma forte travagem. O regresso à divisa nacional custaria também extremamente caro em: fabrico da nova moeda fiduciária, a sua colocação em circulação, reconversão de todo o sistema monetário e financeiro, a redefinição de uma política monetária nacional. Recordemos o tempo e o dinheiro que custou a introdução do euro. A conversão de todos os preços e salários, só por si, poderia levar a tensões sociais ainda mais graves do que as que o país enfrenta hoje. E o élan nacional pretendido não aconteceria.
Nas relações exteriores, entre o estado « expulso » da zona euro e os que o teriam deixado à sua sorte, poderiam mesmo nascer tensões e novos nacionalismos, desaparecidos desde o séc. XIX e XX. O país expulso poderia mostrar-se cada vez mais reticente também em aceitar o controlo da UE e , in fine, poderia até decidir sair da UE. É verdade que hoje há estados-membros dentro da UE e fora do euro, mas são-no por opção e sem contenciosos pelo meio. A saída forçada ou voluntária do euro seria profundamente negativa para a imagem da moeda única e da UE. A força e o prestígio da UE e da sua divisa vêm-lhe sobretudo da imagem de equilíbrio económico, geopolítico e de ajuda mútua que os seus estados-membros devem uns aos outros.
Para Dévoluy pode vir a ser decidida uma divisão da Eurozona em dois grupos. Por um lado, estados que optassem por uma governância económica comum e mais federalismo. Por outro, estados que regressassem às suas moedas nacionais. Mas esta Europa a duas velocidades, decidida em época de crise, poderia ser vista como a tentativa de salvar os bons alunos e de ostracizar os maus, o que descredibilizaria a UE.
Dévoluy considera que uma das soluções à crise do euro é mais federalismo, mas isso implica um novo paradigma político para a UE, mais do que propriamente económico. Dévoluy preconiza a troca da doutrina néoliberal da UE por uma « ordoliberal » , i.e., uma doutrina económica baseada na estabilidade dos preços e na « virtude orçamental ». Ou seja, liberal, mas com ordem, com regras, que evitem as derivas dos mercados. Foi esta « terceira via », situada a meio caminho entre o socialismo e o capitalismo, que permitiu “o milagre económico alemão » após a Segunda Guerra Mundial.
Mas a actual posição do Reino Unido, que bloqueou a possibilidade de uma maior governância económica comum, parece ter deixado o euro num impasse.
Tanto Eichengreen como Dévoluy alertam: é preciso salvar o euro, porque o seu fim provocaria a maior de todas as crises, e até conduzir ao fim da UE.
José Luís Correia
in CONTACTO, 04/01/2012
Quando hoje criticamos o euro pela subida dos preços, um aumento atestado por todos os estudos feitos sobre o assunto, esquecemos o positivo que a moeda única trouxe.
Nunca mais tivemos que transportar meia-dúzia de porta-moedas com diferentes divisas ao viajar pela Europa, nem nunca mais fomos « roubados » no câmbio. Câmbio, aí está uma palavra que não digo há muito. Fazer parte da união económica e monetária protegeu-nos também da onda de choque da crise financeira de 2008, que chegou até nós, sim, mas muito mais tarde e já menos devastadora. Pertencermos ao euro permitiu também manter as taxas de juro baixas até 2010 e 2011, em certos países da zona euro, e isto apesar da crise.
Não esqueçamos também o prestígio que a nossa moeda comum adquiriu nos mercados internacionais, graças ao seu equilíbrio e ao peso político da Europa. Hoje o euro está ligado a 42 países do mundo : os 17 países da zona euro ; os seis estados europeus não-comunitários que adoptaram o euro como moeda principal ou segunda moeda nacional ; e 19 países africanos (entre eles, Cabo Verde) e do Pacífico, que ligaram a sua moeda ao euro. O sucesso do euro fez até com que seis países do Golfo Pérsico se pusessem a pensar em criar uma moeda comum, que os libertasse do « dólar ».
Mas, passada a década de e(o)uro dos anos dois mil, a nossa moeda enfrenta agora, no início dos anos dez, uma grande crise, a « Grande Recessão », como lhe chamam já alguns economistas. A forma como vai ser resolvida esta crise, nos próximos meses e anos, vai reforçar ou fragilizar irremediavelmente a UE. O presidente do Eurogrupo, Jean-Claude Juncker, bem o clama : « A crise não é do euro, é de países como Portugal e Grécia », e é para esse problema que é preciso encontrar uma solução.
Há os que são apologistas da « solução islandesa ». A Islândia, que viveu a falência do Estado em 2008, conseguiu reerguer-se, após três anos de rigor. Num momento em que a UE enfrenta 2012 ainda em recessão, a pequena ilha aponta para um crescimento económico de 3%. Qual é o milagre de Reykjavik ? O Estado islandês decidiu não salvar os bancos em crise, exactamente o contrário do que fez a UE. Melhor, o Estado islandês decidiu não salvar os accionistas, mas proteger os clientes. Mas fazer isso a nível europeu teria um efeito de contágio entre bancos, o que só contribuiria para alastrar ainda mais a crise.
Para escapar à crise da zona euro, há países que já equacionaram abandonar o euro e voltar às suas antigas moedas fortes nacionais, para se protegerem das turbulências dentro da eurozona . Outros falam em expulsar do grupo os maus alunos, como Atenas e Lisboa, e os que se seguirem. É a proposta Merkozy. Economistas como Barry Eichengreen (“The Breakup of the Euro Area », 2007), da Universidade de Berkeley, ou Michel Dévoluy (« L’euro est-il un échec ? », 2011), da Universidade de Estrasburgo, imaginaram o que poderia suceder se isso viesse a acontecer e ambos afirmam que a saída forçada do euro teria consequências nefastas para um estado-membro, mas também para a UE.
Foto:Anouk Antony/LW |
Quer seja a Grécia, Portugal ou outro país, regressar, neste contexto de crise, à moeda nacional significaria forçosamente desvalorizar a divisa, e viver-se-ia uma corrida desenfreada aos bancos por parte dos clientes, que não quereriam perder poder de compra. O que poderia conduzir à fragilização ou mesmo à falência de alguns bancos. Acrescente-se a isso uma forte inflação, fuga dos investidores, aumento das taxas de juro. Se a dívida fosse reestruturada (como fez a Argentina em 2002), por forma a que 1 euro passasse a valer, por exemplo, 20 escudos, em vez de 200 (fosse isso sequer possível !), a medida poderia parecer benéfica para o país, num primeiro tempo, porque diminuiria artificialmente a dívida, mas custar-lhe-ia a credibilidade junto dos mercados financeiros, e a economia sofreria uma forte travagem. O regresso à divisa nacional custaria também extremamente caro em: fabrico da nova moeda fiduciária, a sua colocação em circulação, reconversão de todo o sistema monetário e financeiro, a redefinição de uma política monetária nacional. Recordemos o tempo e o dinheiro que custou a introdução do euro. A conversão de todos os preços e salários, só por si, poderia levar a tensões sociais ainda mais graves do que as que o país enfrenta hoje. E o élan nacional pretendido não aconteceria.
Nas relações exteriores, entre o estado « expulso » da zona euro e os que o teriam deixado à sua sorte, poderiam mesmo nascer tensões e novos nacionalismos, desaparecidos desde o séc. XIX e XX. O país expulso poderia mostrar-se cada vez mais reticente também em aceitar o controlo da UE e , in fine, poderia até decidir sair da UE. É verdade que hoje há estados-membros dentro da UE e fora do euro, mas são-no por opção e sem contenciosos pelo meio. A saída forçada ou voluntária do euro seria profundamente negativa para a imagem da moeda única e da UE. A força e o prestígio da UE e da sua divisa vêm-lhe sobretudo da imagem de equilíbrio económico, geopolítico e de ajuda mútua que os seus estados-membros devem uns aos outros.
Para Dévoluy pode vir a ser decidida uma divisão da Eurozona em dois grupos. Por um lado, estados que optassem por uma governância económica comum e mais federalismo. Por outro, estados que regressassem às suas moedas nacionais. Mas esta Europa a duas velocidades, decidida em época de crise, poderia ser vista como a tentativa de salvar os bons alunos e de ostracizar os maus, o que descredibilizaria a UE.
Dévoluy considera que uma das soluções à crise do euro é mais federalismo, mas isso implica um novo paradigma político para a UE, mais do que propriamente económico. Dévoluy preconiza a troca da doutrina néoliberal da UE por uma « ordoliberal » , i.e., uma doutrina económica baseada na estabilidade dos preços e na « virtude orçamental ». Ou seja, liberal, mas com ordem, com regras, que evitem as derivas dos mercados. Foi esta « terceira via », situada a meio caminho entre o socialismo e o capitalismo, que permitiu “o milagre económico alemão » após a Segunda Guerra Mundial.
Mas a actual posição do Reino Unido, que bloqueou a possibilidade de uma maior governância económica comum, parece ter deixado o euro num impasse.
Tanto Eichengreen como Dévoluy alertam: é preciso salvar o euro, porque o seu fim provocaria a maior de todas as crises, e até conduzir ao fim da UE.
José Luís Correia
in CONTACTO, 04/01/2012
segunda-feira, 2 de janeiro de 2012
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