Em "Espérance de Vie" (Esperança de Vida), editado em Novembro pelas "Presses du Châtelet", Elisabeth Cardoso conversou com 20 individualidades francesas sobre a morte: Raymond Aubrac, Etienne-Emile Baulieu, Philippe Bouvard, Christian Cabrol, Gisèle Casadesus, Thérèse Clerc, François de Closets, Alain Decaux, Danièle Delorme, Jacques Duquesne, Josy Eisenberg, Albert Jacquard, Bernard Joinet, Amadou-Mahtar M'Bow, René de Obaldia, Monique Pelletier, Rémy Robinet-Duffo, Claude Sarraute, Frédérick Tristan e Michel Wagner. O mais "jovem" tem 78 anos, a mais idosa, 98. Todos já ultrapassaram a "esperança média de vida".
Elisabeth Cardoso Jordão nasceu em Esch/Alzette há 38 anos, de pais alentejanos. Fez os estudos universitários em França, depois ingressou na carreira diplomática luxemburguesa, primeiro na Direcção da Cooperação ao Desenvolvimento (responsável por Cabo Verde e pelas relações multilaterais) e depois como n°2 da Embaixada do Luxemburgo em Paris. Desde Setembro, trabalha na OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económicos), em Paris, como "policy analyst".
Quando lhe perguntamos porque razão optou por escrever um livro sobre a morte, algo tão longe do seu universo profissional, e logo no seu livro de estreia, responde: "É a primeira pergunta que todos me fazem, como se fosse uma coisa estranha falar da morte. Ninguém pode dizer que nunca pensa nela, sem que isso queira dizer que está obcecado pelo tema. Quis fazer um livro com questões simples, mas que fale do medo da morte e do sentido da vida. Quando ouço falar em 'esperança média de vida', pergunto-me como se sentirão as pessoas que atingiram essa idade, e que, estatisticamente, deveriam estar a morrer? Como conseguem viver com a ideia que chegaram ao fim da vida, que vai acabar? Têm medo? E se têm, como fazem? Partiu daí a ideia do livro", conta.
O painel de entrevistados surgiu naturalmente. "O conceito era entrevistar pessoas de horizontes diversos que atingiram ou ultrapassaram a idade da esperança média de vida. Eu vivo em França e pareceu-me mais prático entrevistar personalidades francesas. A ideia inicial era misturar anónimos e famosos, mas por razões comerciais o editor achou que o livro devia conter só famosos. No final, consegui mesmo assim introduzir uma ou outra pessoa que não é conhecida do grande público."
Elisabeth diz ter escrito a uma centena de personalidades e estas 20 foram as que lhe responderam. São actores, políticos, intelectuais, artistas, jornalistas, cientistas. Alguns são ateus, outros agnósticos, há católicos praticantes e não praticantes, judeus (entre eles, um rabino) e muçulmanos. "Eu queria saber se com a idade a vida assume um certo sentido, e perguntar quais são as lições que as pessoas tiraram da vida, o que as fez feliz. Era essencial ter o maior número possível de pontos de vista: homens, mulheres, ateus e crentes, de religiões diferentes e das profissões mais diversas."
E a autora, pensa frequentemente na morte?, queremos saber. "Regularmente pergunto-me a mim mesma: estás a agir e a viver de maneira a não te arrependeres de nada quando morreres, ou quando as pessoas de quem gostas morrerem? Hoje, tenho menos medo da minha morte do que da dos meus próximos. Mas penso que quando chegar o momento de morrer, vou estar aterrorizada. O Albert Jacquard [ um dos entrevistados no livro, n.d.R. ] fala do 'prazer da lucidez'. Não gosto nada da ideia de ter que morrer, mas também não quero mentir-me a mim mesma. Sei que não vou escapar, então prefiro enfrentar a ideia e preparar-me para as coisas que posso prever (enterro, doação de órgãos, etc.), para depois já não precisar de pensar nelas. Falo sobre a minha morte com facilidade se penso nela, ou se me vejo confrontada com a morte dos outros. Mas, por vezes, o mais difícil não é falar, é encontrar uma pessoa que esteja à vontade para ouvir, dialogar. Até posso rir da morte. Mas francamente, a maior parte do tempo, penso e faço mil outras coisas. Vivo, simplesmente."
Este livro não foi, diz Elisabeth, uma busca existencial, mas admite que as suas próprias convicções saíram reforçadas. "A expressão 'busca existencial' tem uma conotação quase filosófica e um pouco grandíloqua. O meu objectivo não era encontrar respostas. Era mais curiosidade por ver como pensam os outros. Nesse sentido, foi um exercício muito interessante. Eu tenho a minha própria visão e as minhas convicções sobre a morte em geral, e a minha em particular. As respostas dos entrevistados, de uma certa maneira, fortaleceram nas minhas convicções. E talvez esteja um pouco mais serena por ver que se pode ser muito velho sem se estar desesperado, e que não vale a pena passar muito tempo a angustiar-se porque isso não muda nada."
Das entrevistas percebeu ainda que se a morte ainda é um tabu, também o é porque há medo e sofrimento ligados a esta.
"Ninguém sabe muito bem o que dizer a um adulto que tem medo ou que sofre além de 'deixa lá, isso vai arranjar-se', ou 'é a vida!'. Como não sabemos como reagir, sentimo-nos desconfortáveis e preferimos fugir à conversa, virar as costas, não pensar mais nisso. E isso, é tabu. É humano. Penso que confessar que se tem medo não é uma fraqueza, pelo contrário. E acho que aqueles que têm medo devem poder encontrar um ouvido que os ouça."
Stéphane Hessel, que assina o prefácio do livro de Elisabeth, conclui que a diversidade destas entrevistas mostra que "a morte não é uma, mas múltipla". "E o que pode a morte trazer-nos?", questiona Hessel. E responde, citando Goethe: "Mehr Licht!" (Mais luz!).
No Luxemburgo, o livro faz parte do catálogo da Livraria Ernster.
José Luís Correia
in CONTACTO, 07/11/2011
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