sebenta de anotações esparsas, pensamentos ociosos, reflexões cadentes, poemas difusos, introspecções de uma filosofia mais ou menos opaca dos meus dias (ou + reminiscências melómanas, translúcidas, intra e extra-sensoriais, erógenas, esquizofrénicas ou obsessivas dos meus dias)
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cahier de notes éparses, pensées oisives, réflexions filantes, poèmes diffus, introspections d'une philosophie plus ou moins opaque de mes journées (ou + de réminiscences mélomanes, translucides, intra-sensorielles et extra-sensorielles, érogènes, schizophrènes ou obsessionnelles de mes journées)

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

Editorial no Contacto: "Olhó Robô"

Esta semana, por iniciativa da eurodeputada luxemburguesa Mady Delvaux-Stehres, vai ser discutido em Bruxelas que tipo de legislação criar a nível europeu para regulamentar os robôs e a inteligência artificial.

Quando o luxemburguês Hugo Gernsback, considerado o pai da ficção científica, escreveu em 1911 o romance de antecipação “Ralph 124C 41+”, sobre um andróide no ano de 2660, nunca imaginaria que viria do seu país uma proposta pioneira para legislar sobre os robôs.

O engenheiro luxemburguês “fugira” precisamente da sua Bonnevoie natal sete anos antes por o seu país se recusar a investir numa lâmpada elétrica que ele inventara. Cem anos depois, o Luxemburgo quer-se um país voltado para o futuro, diferente do que era no virar do século XX e até há bem poucos anos. O país investiu muito na investigação e na biotecnologia, lançou-se na exploração de asteróides e vai criar uma agência espacial.

E esta semana, por iniciativa da eurodeputada luxemburguesa Mady Delvaux-Stehres, vai ser discutido em Bruxelas que tipo de legislação criar a nível europeu para regulamentar os robôs. Até que ponto queremos que os robôs facilitem a nossa vida e que regras são necessárias para que vivam e trabalhem no meio de nós? É a este tipo de questões que Bruxelas vai tentar responder. O documento prevê, por exemplo, que os proprietários de robôs sejam taxados para contribuirem para a Segurança Social, e questiona-se sobre a responsabilidade e a personalidade jurídica que deve ou não ter uma máquina.

Não são perguntas de retórica nem a pensar num futuro longíquo, é matéria que nos interpela já hoje, com robôs – uns com rosto humano, outros nem tanto – a não trabalharem apenas na indústria, mas cada vez mais em hospitais e em setores sensíveis, e brevemente no seio do nosso lar, a “pretexto” de ajudarem nas tarefas domésticas, pessoas deficientes ou idosas.

A emergência do carro autónomo, que deverá ser comercializado em grande escala até 2025, apressou os engenheiros de robótica a trabalharem com psicólogos, sociólogos e filósofos sobre os limites das decisões de uma máquina na interação com um ser humano.

Todos estes decisores, desde os engenheiros aos eurodeputados, parecem esquecer que a literatura já refletiu em muitos destes problemas éticos. Considerada um subgénero, a ficção científica foi quase sempre ignorada pela elite. A grande referência do género, o escritor Isaac Asimov, imaginou as leis robóticas num dos seus livros, em 1942, que respondem a algumas destas questões. Por exemplo, uma das leis de Asimov diz que um robô deve ser programado de forma a nunca ferir um humano, nem deixar que este se magoe; a segunda diretiva estipula que uma máquina deve sempre obedecer a um humano, excepto se as ordens entram em conflito com a primeira lei.

Confrontados com um futuro que chegou mais depressa do que imaginávamos, seria útil e instrutivo (e até lúdico) ir hoje beber inspiração onde ela nunca faltou. Um luxemburguês há cem anos e uma luxemburguesa hoje mostram o caminho.

José Luís Correia, in Contacto, 15/02/2017

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