Nas férias aproveitei ainda para ler "Em busca da identidade-o desnorte" (Abril/2009) do nosso filósofo nacional, José Gil.
Nesta obra, o autor farta-se de desancar no Sócrates, analisando não só a sua maneira de governar, como a forma como este comunica e fala ao país, numa atitude sobranceira e quase "messiânica".
O livro retoma onde Gil nos tinha deixado em "Portugal hoje: o medo de existir" (2004). Gil volta a dissecar os comportamentos, as atitudes e as mentalidades do povo português neste princípio de século XXI. Além de considerar que temos identidade a mais, acha-nos neuróticos. E isso impede-nos de avançar, defende.
Gil põe também o dedo numa das maiores feridas abertas de Portugal: o "chico-espertismo".
Esta maneira muito portuguesa de viver pelas regras do sistema D (desenrasca), o cada um por si, o salve-se quem puder, condenada por alguns, praticada por um número cada vez maior, socialmente aceite pela maioria por ser, entretanto, considerada como a única forma de sobrevivência num país à deriva, e que chega ao paroxismo de ser adoptada até pelos governantes, é o verdadeiro "cancro português".
Este "pathos" (paixão/sofrimento) português mina qualquer esperança de um futuro melhor.
Enquanto o individual prevalecer sobre o geral (a sociedade), enquanto o indivíduo pensar que a sociedade (e o poder) só o quer prejudicar e que só lutando contra tudo e contra todos se safará, a sociedade e a(s) mentalidade(s) não poderão progredir em direcção a um futuro comum melhor.
Porque para avançar num determinado sentido, é preciso acreditar que este nos leva a algum lado. Ora os portugueses já não acreditam... desenganados que estão dos sucessivos governos incapazes, corruptos, trapaceiros e cuja gota que fez transbordar o copo foi o sebastianismo oco e roto que depositaram (alguns ainda depositam!) em Sócrates.
Sem perdermos a esperança, verdadeiro motor da vida, não devemos é, enquanto indivíduos, continuar a ser sebastianistas e esperar o profético "Falta cumprir-se Portugal!" pessoano.
Enquanto nação, sim! Como indivíduos, não! Como nação sim, porque só acreditando num amanhã glorioso isso nos galvanizará nas piores horas. Como indíviduo, ser profético significa ficar à espera do que está previsto acontecer, que a mudança vem dos outros, e paralisa por isso qualquer acção.
É preciso que cada um cumpra o seu sonho, o seu projecto de vida... mas sem que seja em detrimento dos outros. E assim, como nas ondas circulares da água, que transmitem movimento umas às outras, o país acabará por cumprir-se.
Enquanto esperamos, a caravana passa. E se ninguém se mexer, o país adormece, amolece, pára e o século passa. É juntos que podemos alcançar uma vida melhor, uma sociedade mais justa, um Portugal melhor.
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