O mapa cor de Kapuscinski
Faleceu ontem (23 Jan. 2007) de doença grave em Varsóvia o escritor e jornalist a polaco Ryszard Kapuscinski . Tinha 74 anos. Era considerado um dos melhores repórteres de guerra do Mundo e o autor contemporâneo de não-ficção mais corajoso sobre geopolítica, tendo sido diversas premiado com distinções internacionais e prestigiosas, várias vezes nomeado para o Prémio Nobel da Literatura. Em 1999, recebu o Prémio de Melhor Jornalista Polaco do século.
Ryszard nasceu em 1932, em Pinsk, na leste da Polónia (hoje situado na Bielorússia), para onde os pais de origem modesta, mas ambos professores do ensino básico, tinham sido enviados. Em 1945, a sua família mudou-se para a capital polaca, onde RK se formou em História. Começou no jornalismo aos 17 anos, tendo trabalhado para agência polaca de imprensa, para o maior diário polaco "Gazeta Wyborzca" e para os jornais e revistas mais prestigiados do Mundo.
A partir dos anos 50, foi correspondente de imprensa na Ásia, Médio Oriente, América Latina e África, tendo calcorreado mundo e meio. Mas foi a África que sempre regressou.
Pôs o pé em África pela primeira vez em 1957. E foi amor à primeira vista. Lá voltou a conforntar-se com a pobreza extrema da sua infância. "Eu sei o que é caminhar descalço, ainda hoje me sinto mal nos hóteis de luxo, prefiro a companhia dos nómadas", repetiu muitas vezes.
A sua grande ligação ao continente negro, onde voltou repetidas vezes, resultou em várias obras famosas como "Negus" e "Heban". Durante quase 40 anos, percorreu África de lés-a-lés, escreve no prefácio do seu livro "Heban" (Ébano), "evitando os intinerários oficiais, os palácios, os homens importantes e a grande política". Repetindo sempre que recusava o jornalismo do quarto de hotel com ar condicionado, lembra na nota introdutória deste livro que sempre preferiu deslocar-se "num camião em segunda mão, correr o deserto com os nómadas, ser o hóspede da savana tropical. A vida destes é um lamento, uma tormenta que suportam com uma resistência e uma serenidade incríveis", descreve.
Fala de África e das suas gentes como um olhar humanista, não de etnólogo frio e distante, mas deixando-se apaixonar pelo que ia descobrindo. As gentes e a terra. Mas detestava os políticos que (des)governam África.
Nas suas póprias palavras, "a África é um continente demasiado vasto para ser descrito. É um verdadeiro oceano, um planeta à parte, um cosmos heterogéneo e muito rico. Dizemos 'África' mas é uma simplificação sumário e cómoda. na realidade, à parte a noção geográfica, a África não existe."
No livro "Heban" assiste à descolonização mas também à vida quotidiana, algo destabilizadora para um europeu. Assistiu a guerras civis e tribais atravessando o Gana, Uganda, Tanzânia, Etiópia, Zanzibar, Libéria, Ruanda, Mali, Sudão, Nigéria e Senegal. Neste livro percebe-se, por exemplo, a origem complexa dos genocídios no Ruanda.
Era um poeta na linha da frente. Em 1981 começou também a fazer fotografias. Via o mundo transformar-se com um olhar de criança. Não um olhar ingénuo e infantil, mas puro e despojado de preconceito.
Recordo um artigo que escreveu há um no "Monde Diplomatique" sobre a tolerância e o nosso comportamento face a outros povos e culturas.
Escreveu mais de 20 livros não apenas sobre África, mas igualmente sobre a União Soviética, o Irão (Shah), a América Latina (The Soccer Wars).
Com 74 anos, planeava ainda escrever vários livros: um sobre a América Latina, outro sobre o Pacífico, bem como uma obra sobre Bronislaw Malinowski, um conterrâneo seu considerado o pai da Etnologia. Chegou a revelar que seria um tentativa de resposta a Huntington, que considera o choque de culturas como um perigo, enquanto que Kapuscinski via nesse encontro uma oportunidade para a Humanidade.
quarta-feira, 24 de janeiro de 2007
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