sebenta de anotações esparsas, pensamentos ociosos, reflexões cadentes, poemas difusos, introspecções de uma filosofia mais ou menos opaca dos meus dias (ou + reminiscências melómanas, translúcidas, intra e extra-sensoriais, erógenas, esquizofrénicas ou obsessivas dos meus dias)
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cahier de notes éparses, pensées oisives, réflexions filantes, poèmes diffus, introspections d'une philosophie plus ou moins opaque de mes journées (ou + de réminiscences mélomanes, translucides, intra-sensorielles et extra-sensorielles, érogènes, schizophrènes ou obsessionnelles de mes journées)

sábado, 25 de novembro de 2006

Porto sentido, sentado no Grund

Chove há quantos dias? O Outono, que eu sempre idealizara romântico e ameno, em cores de auriverde, como num filme piroso com a Winona Ryder e o Richard Gere, destila-se em cheias e aguaceiros, em rajadas e trovoadas, escorre pelas paredes do mundo e pelas sarjetas da minha rua. “Água que Deus amanda”, oiço a minha mãe explicar-me, junto ao velho fogão a lenha, nas noites de tempestade em que eu não conseguia dormir a não ser no seu colo morno, como se a benignidade da benção divina servisse apenas para fertilizar a terra e não para assustar os homens.

Um passeio no Grund ou no Cais das Barcas, debaixo da ponte vermelha ou da ponte D. Luiz, uma Guinness no Scott's, atravessando o Alzette e a Pétrusse, ou um Calém Reserva, a caminho do Taylor's, como “quem vem e atravessa o rio, junto à serra do Pilar, vê um velho casario, que se estende até ao mar”.

A luz foge à manhã, que se esvai taciturna, moribunda e inane. Aqui, nas terras vermelhas, do promontório deste burgo ou na Foz do Douro... Não suporto crepúsculos a meio da tarde. Ou que as sombras comam os dias como os que eu quisera ledos em Wroclaw e Zakopane. Quero exorcizar de mim os velhos amores que me assombram, a depressão de Inverno, que sinto chegar por uma escada oculta. Escrevo à menina. Assedia-me o travo perfumado, a lembrança da sua língua, dos meus gestos antes tímidos, da linguagem muda das nossas bocas querendo deflagrar o Outono, dos nossos corpos hesitantes, que finalmente mergulham de olhos bem abertos um no outro, num hotel sem nome, junto a um aeroporto, cais moderno das novas partidas, que nos lembra com insistência que o nosso voo também será breve e que os amantes se deverão apartar. Para mais tarde se juntar, quis acreditar.


nova babel


Fui ver o filme “Babel” de Alejandro González Iñárritu (“Amores Perros”, 1999; “21 Grams”, 2003). A torre não chegou ao céu, mas mundializou-se. Uma espingarda norte-americana, comprada por um japonês viúvo, pai de uma jovem em plena crise de adolescência, é usada por uma criança marroquina que brinca nos planaltos do Atlas para alvejar uma turista americana, que correu meio-mundo atrás do marido, depois deste fugir da morte súbita do recém-nascido de ambos, enquanto os filhos do casal são levados pela baby-sitter mexicana, ilegal há 16 anos nos Estados Unidos, para uma casamento muy tipico para além do novo muro da vergonha.

Globalizou-se também a confusão das línguas e das culturas. É o que nos querem fazer querer, desde os deturpadores de Samuel Huntington aos seguidores de Alvin Toffler. Mas entre homens de boa vontade, a língua pode ser diferente, a linguagem é perceptível, a mensagem passa. Neste filme, entre a criada mexicana e os filhos do casal americano, entre o marido da turista americana e o jovem marroquino que o acolhe na sua aldeia perdida, ou entre a surda-muda e o polícia que não precisa de gestos para entender o pedido de socorro da jovem.

(Sempre pensei que os casos em que os pais falam aos filhos em árabe, berbere, italiano ou português e estes respondem em francês ou que quando eu falava à minha namorada em algarvio e ela me respondia, por graça, em luxemburguês, isto fosse uma caracterísitica que apenas existia em França ou no Luxemburgo. Na minha ingenuidade etnocentrista, esqueci que todas as comunidades emigradas, em qualquer que seja o país onde se encontram, tendem a reproduzir os mesmos mecanismos de integração na sociedade e cultura de acolhimento. Que rima, em maior ou menor grau, com assimilação, consoante o sistema social e educativo do país onde chegaram e do envolvimento dos pais na educação (no sentido lato) dos seus filhos.
Fechar parêntesis.)

No sentido inverso, nem sempre a mesma língua é uma condição sine qua non para que os homens se percebam, levantando a desentendimentos, depressões, brigas, confusões, mortes. No filme: o marido da turista e os outros turistas americanos e europeus (ocidentais!), pai e filha no Japão, esta e os outros jovens japoneses, a polícia marroquina e os aldeões, tia e sobrinho mexicanos.

Assim sendo, devemos atribuir à torre de Babel, a origem da confusão das línguas ou aos homens de má vontade?

A morte e o seu espectro pairam durante toda a história. Não sabemos quando acontecerá, mas presentimo-lo. Acaba por abater-se sobre um inocente. Uma morte ligada à compra de uma arma. Mesmo se o realizador escolheu (propositadamente?) um cenário do outro lado do mundo, acaba por ser um piscar de olhos ao porte de arma permissivo nos Estados Unidos, que diz respeito a muitos jovens que são vítimas do “first amendement”, estejam do lado de cá ou do lado de lá do gatilho.

A torre de Babel, esta aldeia global na qual vivemos, está longe de chegar ao céu!
Se Fernando Pessoa disse que a sua pátria era a língua portuguesa, para o realizador mexicano, a "pátria" ou mesma a "mátria" (do latim "mãe") é... a mensagem. A mensagem é mais importante que a língua. As crianças, que vejo nos infantários e escolas luxemburgueses rirem e brincarem entre si sem falarem uma mesma língua, são as que no-lo ensinam melhor.

sexta-feira, 24 de novembro de 2006

(todos) repórteres sem fronteiras

Àcerca do post de 24 de Novembro do meu caro amigo Paulo Lobo no seu blog «Voyages en suspens» (http://www.paulolobo.blogspot.com/), em que diz que hoje “somos todos canais alternativos da informação, nós os internautas, os bloguistas, os passadores de ideias, de opinião e, por vezes, de rumores”, queria reagir recordando que a mui séria agência de imprensa internacional Reuters assinou há dias (dia 11 de Novembro?) uma parceria com a plataforma norte-americana Pluck (http://www.pluck.com/), que administra milhares de diários cibernéticos pessoais (web-logs ou blogs). A Reuteres passará a propôr, a par das suas notícias em linha, informações que fazem parte do conteúdo de blogues, promovendo o que apelida de “social networking” (teia de contactos e informacão social).

Ponto positivo: as fontes de informação indepedentes diversificam-se em número e riqueza de conteúdo, ao contrário dos cada vez maiores conglomerados media, que monopolizam o sector, e que, apesar das posições firmadas que ocupam, trabalham muitas, quase sempre, sob a pressão de lobbys, influências e poderes.

Apreensão: banalizando-as, as fontes de informação perdem em fidignidade e pureza: risco de manipulação da opinião pública. O mesmo poder, afinal, que os grandes conglomerados já hoje detêm. Os profissionais da informação deixarão de ter o monopólio da mediação da informação. Única solução: formar a opinião pública para que adopte os reflexos dos profissionais da informação, ou seja: 1) duvidar, por princípio, dos media; 2) assegurar-se da credibilidade da fonte; 3) multiplicar, mais do que nunca, o cruzamento de fontes; 4) consumir informação onde seja respeitado o princípio do contaditório.
Nova missão dos profissionais da informação: não apenas “servir” à notícia numa bandeja, nem servir somente à mediação e veiculação da notícia, mas à sua decorticação, dissecação, descodificação, interpretação, análise.