sebenta de anotações esparsas, pensamentos ociosos, reflexões cadentes, poemas difusos, introspecções de uma filosofia mais ou menos opaca dos meus dias (ou + reminiscências melómanas, translúcidas, intra e extra-sensoriais, erógenas, esquizofrénicas ou obsessivas dos meus dias)
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cahier de notes éparses, pensées oisives, réflexions filantes, poèmes diffus, introspections d'une philosophie plus ou moins opaque de mes journées (ou + de réminiscences mélomanes, translucides, intra-sensorielles et extra-sensorielles, érogènes, schizophrènes ou obsessionnelles de mes journées)

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Um café e um croissant

- Aqui fazemos o melhor café da Europa!

- Pois, nós em Portugal também dizemos isso, eh eh...

- Mas fomos nós que introduzimos o café na Europa, sabias?

- Foram os turcos, queres tu dizer...

- Sim, mas foi graças a um polaco!

- Como assim?...

- Quando os otomanos foram derrotados às portas de Viena em 1683 e fugiram, deixando para trás acampamentos militares inteiros montados, uma das coisas que lá foi encontrado foram sacos de café, que um polaco que ali morava logo comprou, para vender na sua taberna. E foi a partir de Viena que o café chegou ao resto da Europa. E é por isso que ainda hoje café em polaco se chama kawa, uma palavra muito próxima do árabe qahvah e do turco khave.

Mariusz, o empregado da café onde me refugiei do frio e da neve de Novembro, em Cracóvia, contou-me então como o rei polaco Jan Sobieski e 30 mil homens tinham ajudado o Império Austro-Húngaro e a Europa contra a segunda invasão turca. O que é um facto histórico. Já quanto à história do café, fiquei com as minhas dúvidas, mas achei curiosa a convicção.

Eram três e meia da tarde, a noite tinha já descido sobre Cracóvia, quando me assolou um intenso desejo de café com xarope de avelãs. Tentando encontrar o meu caminho entre a neblina fina, nem sequer me detive diante dos quadros dos artistas expostos na Porta de São Floriano, e enfiei-me na primeira kawiarnia que encontrei. Os cracovitas gostam de dizer que a sua cidade é conhecida por ter mais igrejas do que dias tem o ano e que só o número de cafés se equipara ao dos templos. Mas enquanto os primeiros são procurados para aquecer a alma, os segundos são-no para acalentarem os corpos.

E com esta conversa, Mariusz conseguiu convencer-me a provar o "café à turca", que os polacos ainda hoje costumam servir, e que é bardzo melhor que essas invenções starbuckianas de café com... avelãs.

A kawiarnia estava instalada numa cave, com paredes em tijolos, e eu tinha escolhido uma mesa num canto, tão pequena que não conseguia arrumar os jornais e os braços em cima do tampo de mogno quadrado. Na parede estavam suspensos velhos capacetes de bombeiros que alguém teve a luminosa ideia de adaptar com uma lâmpada para serem utilizados como candeeiros.

- E foi também graças a essa vitória que nasceram os croissants, ainda hoje chamados viennoiserie. Um pasteleiro de Viena achou graça pôr os viennenses a comerem o símbolo da lua crescente dos turcos, interrompeu Mariusz os meus pensamentos, servindo-me o café e um croissant, "oferta da casa".

- Então é isto a famosa hospitalidade polaca?

- Pois, porque não são só vocês portugueses que têm a fama de serem hospitaleiros.

Alexandre Weytjens
(foto e texto)

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