sebenta de anotações esparsas, pensamentos ociosos, reflexões cadentes, poemas difusos, introspecções de uma filosofia mais ou menos opaca dos meus dias (ou + reminiscências melómanas, translúcidas, intra e extra-sensoriais, erógenas, esquizofrénicas ou obsessivas dos meus dias)
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cahier de notes éparses, pensées oisives, réflexions filantes, poèmes diffus, introspections d'une philosophie plus ou moins opaque de mes journées (ou + de réminiscences mélomanes, translucides, intra-sensorielles et extra-sensorielles, érogènes, schizophrènes ou obsessionnelles de mes journées)

quinta-feira, 29 de março de 2012

Um dos planetas-irmão da Terra fica a 23 anos-luz


O planeta-irmão mais próxima da nossa Terra até agora descoberto fica "apenas" a 23 anos-luz de nós, e faz parte de um sistema estelar triplo (três estrelas). Trata-se do planeta Gliese 667 Cc, que é quatro vezes maior que a Terra e, pelas suas características, é considerado o "irmão" do nosso.

Durante seis anos, uma equipa de cientistas do Óbservatório Europeu do Sul ESO (European Southern Observatory, situado no Chile) sondou graças ao espectógrafo "caçador de planetas" HARPS (High Accuracy Radial velocity Planet Searcher) uma amostra de 102 estrelas anãs vermelhas da nossa galáxia e descobriu nove (9) Super-Terras, entre elas Gliese 667Cc. 

O HARPS permitiu descobrir que as Super-Terras (planetas entre uma e dez vezes maiores que o nosso) são muito comuns na zona habitável ("zona de vida" ou "goldilock zone") das estrelas mais comuns da nossa galáxia, as anãs vermelhas de fraca luminosidade.

As anãs vermelhas (ou anãs M) constituem cerca de 80 por cento das estrelas da nossa galáxia (c. 160 mil milhões de estrelas) e destas, cerca de 41 por cento têm uma Super-Terra na sua órbita, na zona de vida, isto é, onde pode existir água líquida na superfície do planeta. As anãs vermelhas são mais frias e de mais fraca intensidade que o nosso Sol, que é uma anã amarela (ou anã G).

Xavier Bonfils, da equipa de cientistas do ESO que fez esta descoberta, estima que há dezenas de milhares de planetas deste tipo na Via Láctea e cerca de uma centena só na vizinhança imediata do nosso Sol, ou seja, a menos de 30 anos-luz (como é o caso de Gliese 667Cc)



A equipa descobriu igualmente que planetas gigantes (entre 100 e 1000 vezes maiores que a Terra), normalmente planetas gasosos, do tipo Júpiter ou Saturno, são mais raros em torno das anãs vermelhas (apenas 12 por cento).

Esta descoberta vai facilitar a procura de planetas em que a vida é possível, já que avaliou a percentagem das possibilidades de Super-Terras em torno das estrelas mais comuns da nossa galáxia.




sábado, 24 de março de 2012

As três razões pelas quais vejo "Once Upon a Time"

The Swan, aka Jennifer Morrison
Snow White, aka Ginnifer Goodwin

Rumpelstiltskin, aka Robert Carlyle

A história passa-se nos dias de hoje e tem como cenário a cidade fictícia de Storybrooke, no ...Maine. Na cidade moram personagens de contos de fada,mas que esqueçeram quem são. Os personagens foram vítimas de um feitiço por parte da Bruxa Má para se vingar da Branca de Neve e do Príncipe Encantado, foram exilados no nosso mundo e esqueçeram a sua verdadeira identidade.

Antes que o feitiço se abata sobre as personagens do mundo imaginário, Branca de Neve consegue enviar a filha, Swan, para o mundo real. Esta escapa ao feitiço e cresce em Boston sem saber quem são os seus pais.

Vinte e oito anos depois, um menino, Henry, vem bater à porta de Swan e anuncia-lhe que é o seu filho e neto de Branca de Neve. Swan não acredita na criança, mas ajuda-o a regressar a casa.

Chegados a Storybrooke, este pede que ela o ajude a despertar as personagens do feitiço. Sem acreditar em Henry, Swan vai ficando pela cidade, porque repara como a mãe adoptiva, Regina, o negligencia. Henry explica-lhe então que a mãe adoptiva é na realidade a Bruxa Má e que a única a poder quebrar o feitiço é Swan.

Para acrescentar mais mistério à história, há uma personagem ainda mais enigmática: Rumpelstiltskin, que consegue manipular todos os moradores e até a Rainha Má. É também o único a recordar-se de quem realmente é...


quarta-feira, 21 de março de 2012

À conversa com os escritores José Luís Peixoto e Altina Ribeiro

Emigração, filha bastarda da literatura portuguesa 
 


A emigração portuguesa vista por José Luís Peixoto e Altina Ribeiro. Duas gerações, duas experiências, dois livros sobre um tema que a literatura portuguesa ainda enjeita, lamentam os dois escritores.

A conferência com os escritores José Luís Peixoto e Altina Ribeiro, no domingo, no Salão do Livro do Festival das Migrações, acabou por ser totalmente dominada pelo tema da emigração. Ou não fossem os mais recentes romances dos dois autores dedicados a esse tema.

No caso de Altina Ribeiro, tanto o seu primeiro livro "Le fado comme seul bagage" (que vai ser adaptado para cinema por Anna da Palma), como o segundo, "Alice au pays de Salazar", falam da emigração. No primeiro fala de como emigrou para Paris com os pais, aos 9 anos, em 1969. O segundo é a história de uma amiga, que lhe pediu para contar em livro a sua experiência da emigração.

No seu último romance, intitulado "Livro", José Luís Peixoto inspira-se na emigração dos pais para França, também nos anos 60. "A emigração para mim é a história antes de mim, porque eles regressaram a Portugal após o 25 de Abril e eu nasci em Setembro de 1974", diz.

  Altina resume o seu primeiro livro, no qual fala de como se sentiu desenraizada, de como descobriu a electricidade pela primeira vez, do "décalage" intergeracional com os pais, da emigração clandestina, dos "bidonsvilles" (bairros de lata). Recorda como o pai foi "a salto" para França, quase dois mil quilómetros a pé e em camiões de gado. Altina tinha dois anos e recorda que não reconhecia o pai quando este voltava a Portugal. "Quando vinha, o meu pai era um estranho, eu até ficava aliviada quando ele se ia embora".

Para Peixoto, a emigração era o que ouvia das conversas entre os pais e as irmãs. Eram as "auto-rutas", os "auto-buses", os "fogos-ruges", os "magasins", uma linguagem codificada e misteriosa para a criança que José Luís era, confiou no altura em que lançou o livro, em 2010. "Quando falavam de França, eu ficava de fora". "Há muitos filhos de emigrantes que vão para Portugal para descobrir o país dos pais. Este 'Livro' é para mim o caminho inverso, sou eu a tentar descobrir a emigração que os meus pais viveram. E também foi para me descobrir a mim próprio. Sou da geração que se define pelo que não viveu: a ditadura, a revolução, a emigração, a guerra colonial. Graças a este livro percebi o contexto em que nasci".

Peixoto conta que a reacção que o "Livro" recebeu fez-lhe perceber que em Portugal se precisava de falar deste tema. "Algumas pessoas perguntaram-me se eu tinha feito muita pesquisa para escrever este livro. Parece que não se dão conta que a emigração ainda é uma realidade". E lamenta que nem os antigos emigrantes falem, nem o resto da população, para quem a emigração parece um acto consumado, quando esta nunca realmente cessou. "Não há muitos romances sobre a emigração portuguesa e isso é inacreditável, quando um milhão e meio de portugueses emigrou para França nos anos 60 e 70. A literatura portuguesa raramente aborda o assunto, é tabu, não se fala e há sobretudo muitos clichés", critica o escritor. "Não há uma relação pacífica com este tema. Eu não sabia que havia dificuldades em Portugal para falar nisto. Para mim foi fácil, porque não o vivi. Mas penso que escrever sobre isso pode tornar mais sã a nossa relação com o passado. Em Portugal temos um problema com muitas questões do nosso passado, não só com a emigração".

"Os emigrantes merecem um reconhecimento porque construiram dois países, o país que deixaram e para onde enviavam dinheiro, e o país onde trabalharam. Admiro-os porque se lançaram no desconhecido e seguiram os seus sonhos. Quem segue os seus sonhos faz o mundo avançar".

"O meu primeiro livro é uma homenagem aos meus pais e a todos os emigrantes", diz também Altina. "Eles não sabiam escrever, não tinham meios para contar essa experiência, essa dor, então contei-a eu".

Na sua relação com a emigração como noutros domínios, Peixoto considera que Portugal é "bipolar".

"Acho que o país precisa de uma psicanálise. Num dia, somos os maiores, não há Expo como a nossa, vamos ganhar o Mundial de Futebol. No outro, somos os mais desgraçadinhos". Para o escritor, Portugal "evoluiu demasiado depressa" no último meio século. "A imagem do país deixou de ser a velhinha vestida de preto e com bigode, para passar a ser a ponte Vasco da Gama. Não percebo porque temos orgulho numa coisa, e esquecemos e escondemos a outra. As duas coisas coabitam, essa velhinha de bigode é a nossa avó, e é muito triste ter vergonha da nossa avó. Temos que encontrarmo-nos como país nesses dois pólos", aconselha José Luís Peixoto ao deitar o país no divã.

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Entrevista com José Luís Peixoto

"Cada romance é uma 
experiência muito sentida"


CONTACTO: É a segunda vez que vem ao Luxemburgo...

José Luís Peixoto:
É a terceira! A primeira vez foi há 20 anos com os meus pais, viemos de carro e parámos aqui uma tarde... A segunda foi em 2009 para a Primavera dos Poetas e esta é a terceira vez.

CONT.: Como foi esta visita, no âmbito do Festival das Migrações?

J.L.P.:
Este festival deu-me a imagem da sociedade multicultural que o Luxemburgo é.

CONT.: O contacto com os seus leitores de cá foi gratificante?

JLP:
Desta vez aconteceu algo que nunca me tinha acontecido ainda no estrangeiro, que foi encontrar realmente muitas pessoas que já conheciam os meus livros. O meu último romance ["Livro"] toca a realidade da emigração portuguesa e foi muito gratificante perceber que o livro tinha chegado a algumas destas pessoas. Foi como lhes devolver algo que me deram de cada vez que estive com portugueses fora de Portugal.

CONT.: Nesse seu livro fala da emigração, inspirando-se na experiência que os seus pais tiveram em França nos anos 1960 e que faz parte da história "antes de si", como costuma dizer. Mas quando foi professor em Cabo Verde, também viveu a emigração...

JLP:
Estive lá apenas um ano e meio, e não considero que tivesse sido uma experiência de emigração. Primeiro, porque nunca pensei em ficar lá muito tempo, depois porque era um país de língua portuguesa, com muitas referências idênticas a Portugal, e não acho que seja comparável... A distância, claro, fez aperceber-me que só damos valor a certas coisas quando estamos longe.

CONT.: O miúdo que escrevia para o DN Jovem nos anos 1990, imaginava um dia viajar pelo mundo para falar dos seus livros?

JLP:
Não imaginava e confesso que nem sequer me permitia sonhar tanto. Eu tinha vontade de publicar livros, ter leitores e a escrita sempre na minha vida. Hoje, vivo coisas que nunca imaginei, como chegar aqui e encontrar pessoas que já leram o que escrevi, isso é fascinante. Enquanto escrevia nunca imaginei que pudesse ser esse o destino daquilo que escrevia. Mas, é verdade que escrever comporta essa transcendência, é lançar palavras para um horizonte que nunca conseguimos muito bem controlar.

CONT.: Hoje escreve pelas mesmas razões pelas quais escrevia na adolescência?

JLP:
Tento não perder de vista as razões que me levavam a escrever quando era adolescente, porque eram de um grande entusiasmo e pureza, que é muito importante manter. Crescer não significa recusar aquilo que fomos. Há características que importa nunca perder, como a capacidade de acreditar.

CONT.: Foi difícil vingar como escritor?

JLP:
O primeiro livro que publiquei, que não considero um romance, chama-se "Morreste-me" (2000), e foi lançado em edição de autor. Já tinha escrito aquele que viria a ser o meu primeiro romance, "Nenhum Olhar" (2000), e andava à procura de editor de uma forma muito simples, enviando manuscritos pelo correio. E não foi realmente muito fácil: ou não recebia respostas positivas ou não recebia resposta nenhuma. Foi assim durante cerca de um ano, até que recebi finalmente uma resposta de uma editora e as coisas evoluiram. Depois veio o Prémio Saramago em 2001 e um reconhecimento a vários níveis. Sinto que, mesmo que nada disso tivesse acontecido, eu teria continuado a escrever. Talvez escrevesse algo diferente, a minha vida teria sido talvez diferente. Mas, penso que essas dificuldades até foram positivas, porque são as dificuldades que nos fazem sentir a realização no momento em que as conseguimos ultrapassar.

CONT: Mas também passou por momentos muito difíceis...

JLP:
Esse tempo das dificuldades não foi enquanto escritor que as vivi, mas como professor, porque por vezes havia ordenados em atraso. Curiosamente quando passei do ensino para a escrita, foi passar para uma actividade instável, como é a escrita, mas vindo de uma actividade que não é particularmente estável, como é o ensino em Portugal. Os primeiros tempos não foram muito fáceis, porque ainda não escrevia para os jornais e as revistas com que colaboro hoje, nem tinha tantas solicitações. Mas, a pouco e pouco e com muito trabalho, as coisas foram-se consolidando. Hoje, a escrita passou a ser uma ocupação que, em termos de segurança, me permite viver de uma forma que acaba por ser muito mais estável do que se tivesse continuado no ensino, porque olho para os meus colegas e vejo a situação em que estão.

CONT.: Quer dizer que se pudesse falar hoje com o José Luís Peixoto que escrevia para o DN Jovem lhe diria para continuar a acreditar no sonho de escrever?

JLP:
(Risos) Sim, sim, sem dúvida... Eu tenho a grande sorte de ter descoberto, muito claramente, o que queria fazer, que era escrever. Nunca escrevi porque não pudesse fazer outra coisa, mas porque era exactamente isso que queria fazer. Hoje, continuo a ter o privilégio imenso de poder desenvolver a minha vida profissional nessa área.

CONT: Escreve poesia, teatro, ficção. Sente-se mais confortável em que disciplina?

JLP:
Cada uma dessas áreas dá-me um prazer diferente e aprendo com todas elas lições que utilizo depois em todas as outras. Hoje, os romances têm um lugar muito importante para mim. São como pilares de um templo que determinam a cronologia da minha vida. O romance é um género particularmente exigente, que obriga a uma vivência bastante intensa das personagens, das situações, e isso faz com que se misture muito com as impressões que estou a viver em cada momento. Por isso, cada romance é uma experiências muito sentida.

CONT.: Confiaram-me que aqui no Luxemburgo tem tentado escapar ao programa da estadia para tentar escrever ao máximo. Podemos esperar uma ficção cujo teatro é o Grão-Ducado?

JLP:
Já escrevi dois textos no Luxemburgo e espero escrever mais. Nunca se é completamente imune ao lugar onde se está. No entanto, não penso que vou escrever sobre o Luxemburgo, até porque escrever sobre algo necessita de uma certa reflexão e de um certo distanciamento. Penso que as visitas ao Luxemburgo, a darem algum fruto, será depois de eu as maturar bem.

CONT.: Está a trabalhar nalgum novo romance?

JLP:
Sim, tenho sempre um romance em preparação, pelo menos na cabeça, mas não quero ainda revelar muito sobre isso...

Posso dizer que em Abril vou publicar, pela primeira vez, um livro infantil. É para leitores muito sinceros, por isso estou um pouco ansioso. Até agora nunca tive que pensar que estava a escrever para uma faixa etária específica, mesmo se escrevia principalmente para adultos.

CONT.: E já testou em casa, com o seu filho de seis anos?

JLP:
Sim, já testei (risos), várias vezes até!

CONT: E o que anda a ler neste momento?

JLP:
Estou a ler "A arte de viajar", de Alain de Botton.  

Texto e Entrevista: José Luís Correia 
Fotos: Carlos de jesus
(in CONTACTO, 21/12/2011)  

terça-feira, 20 de março de 2012

Especular na bolsa, tão verdade há 150 anos como hoje

"Para as especulações na Bolsa, Fevereiro é um dos meses mais perigosos. Os outros são Julho, Janeiro, Setembro, Abril, Novembro, Maio, Março, Junho, Dezembro, Agosto e Outubro."

Mark Twain (1835-1910)

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quinta-feira, 15 de março de 2012

Harold Bloom arrasa "Caim" de José Saramago

Um dos mais prestigiados críticos literários da actualidade, Harold Bloom assina um artigo na edição de 23 de Fevereiro da The New York Review of Books dedicado a José Saramago.

Intitulado “O grande comediante revisita a Bíblia”, o artigo do conhecido crítico literário norte-americano, que também é professor de Humanidades na Universidade de Yale, e de Inglês na Universidade de Nova Iorque, debruça-se sobre a edição americana de "Caim" (editado em Portugal em 2009; editado nos EUA em Outubro de 2011), a última obra que Saramago publicou em vida (morreu em Junho de 2010).

Bloom fala como conheceu Saramago, no dia em que o crítico literário se deslocou a Portugal para ser distinguido pela Universidade de Coimbra, e como os dois travaram um "conhecimento caloroso", mas também fala de um "desacordo exegético" que os opôs devido a "O Evangelho Segundo Jesus Cristo" (1991). Bloom, que apelida Saramago de "estalinista irredutível", considera que nesse seu livro o português nem se dá conta que retrata "um Deus que tem muitas afinidades com o tirano georgiano".

Para Bloom, “Caim” é um epílogo deliberado e burlesco ao “Evangelho”. Mas "falta-lhe mais humor" nesta obra, escrita quase duas décadas depois do "Evangelho".

"Como admirador de há décadas de Saramago, não quero depreciar esta ficção final. Prefiro considerá-la como algo que me ajuda a apreciar as suas concretizações ascéticas. O que corre mal em 'Caim' é que o autor é demasiado tendencioso e nos quer convencer, impôr um desígnio. A necessidade que [Saramago] tinha de lutar contra o fascismo e a Igreja sempre ameaçaram distraí-lo da sua verdadeira genialidade de contador de histórias cómicas. O Evangelho é assustadoramente cómico, Caim apenas faz sorrir."

Bloom faz uma justaposição entre o final de "Caim" e o de um outro livro do escritor, "O Ano da Morte de Ricardo Reis" (1984). “Os mundos de Pessoa e Reis são tão diferentes como o são os de Caim e de Deus”, resume Bloom. E depois compara com o final de “O Evangelho Segundo Jesus Cristo".

"A dignidade ascética e o pathos trágico que podemos encontrar [no Evangelho] são qualidades que estão ausentes em Caim, do príncipio até ao fim do livro”, lamenta.

Para Bloom, o leitor que quiser encontrar o Saramago genial vai ter que procurá-lo em "História do Cerco de Lisboa" (1989) ou em "Jangada de Pedra" (1986), não no seu livro final. "'Caim' foi um erro, mas que não deve macular o nosso sentimento de uma partida gloriosa [de Saramago]", conclui.

Saramago, Calvino, Garcia Márquez e Twain  

Bloom considera que Saramago era acima de tudo um "romancista cómico" e que era "admirável" nâo só essa sua "tenacidade cómica", como "a forma como este queria fazer funcionar os seus textos de forma nitzschiana".

Bloom compara Saramago a Italo Calvino, Gabriel Garcia Márquez e Mark Twain. "Twain teria gostado de Saramago, ambos eram anticlericais (...) e sabiam retratar a ferocidade fundamental da natureza humana e da sociedade".

"Cain", traduzido por Margaret Jull Costa, saiu nos Estados Unidos com a chancela da Houghton Mifflin Hartcourt (159 páginas) e custa 24 dólares.

segunda-feira, 12 de março de 2012

Número de portugueses no Luxemburgo poderá aumentar em 11.000 em dois anos

Foto: JLC
Cinco mil portugueses inscreveram-se em 2011 no consulado do Luxemburgo e, a manter-se o ritmo de janeiro e fevereiro, o número de novas inscrições consulares poderá atingir as 6.000 em 2012, disse um representante da comunidade.
O conselheiro das Comunidades Portuguesas no Luxemburgo Eduardo Dias falava à Lusa a propósito de uma conferência de imprensa, que dará terça-feira em frente ao consulado-geral de Portugal, para condenar uma alegada intenção de "desqualificar" o consulado-geral, transformando-o em secção consular.
Para o conselheiro, esta alegada intenção, já negada pelo governo, contrasta com a crescente emigração portuguesa para o país.
Eduardo Dias afirma que, com as novas inscrições de 2011 e 2012, o número de portugueses no Luxemburgo poderá atingir os 115 mil.
O aumento da emigração para o Luxemburgo é acompanhado por uma subida da taxa de desemprego. 
Segundo o conselheiro, o número de portugueses desempregados no país passou de 32,8% no final de 2010 para 36% no final de 2011.
Questionado sobre se existem no Luxemburgo situações de carência como têm surgido em outras comunidades portuguesas no mundo, Eduardo Dias considerou tratar-se de "casos isolados": "São pessoas que se deslocam com contratos ou promessas de contratos de curta duração e que rapidamente entram no desemprego e sem condições de habitação".
Por outro lado, afirmou que ao contrário do que acontecia nos anos 60 e 70 - quando "os emigrantes partiam sós e só depois de estabilizados mandavam vir as famílias" -, atualmente viajam famílias inteiras, muitas vezes com crianças em idade escolar", o que dificulta a adaptação.
Comunidade contra intenção de "desqualificar" representação no Luxemburgo, Governo nega 
Representantes da comunidade portuguesa no Luxemburgo acusaram o Governo português de querer "desqualificar" o consulado local, transformando-o em secção consular, mas o secretário de Estado garante que vai manter-se o formato atual.
"É consulado-geral e continua a ser consulado-geral. A única alteração é que o responsável do posto acumula as funções de encarregado de negócios da Embaixada e de cônsul-geral, o que é uma medida de racionalização da despesa e se justifica plenamente no Luxemburgo", disse à Lusa o governante.
José Cesário respondia assim às acusações do conselheiro das Comunidades Portuguesas no Luxemburgo Eduardo Dias, que na terça-feira dá uma conferência de imprensa intitulada "Consulado de Portugal: O Caos", juntamente com outro conselheiro, Acácio Pinheiro.
Eduardo Dias afirma que o Governo decidiu a "desqualificação do consulado-geral de Portugal no Luxemburgo", o que afirma contrastar com o número crescente de portugueses que chegam ao país.
"É um consulado-geral há mais de 30 anos e o Governo quer passá-lo para secção consular", lamentou, afirmando que o mandato do cônsul termina em junho e não haverá substituição.
Já no início do mês, o deputado socialista Paulo Pisco dirigira uma pergunta ao Governo sobre a "retirada definitiva do Luxemburgo" do cônsul-geral de Portugal.
O secretário de Estado José Cesário confirma que "o cônsul-geral atinge o limite de idade em breve", mas garante que vai ser colocado no país um outro diplomata que "vai assumir as funções de cônsul e de número dois da Embaixada". Para o governante, no Luxemburgo um mesmo diplomata "pode desempenhar as duas funções perfeitamente".
Eduardo Dias lamenta também a redução do número de funcionários do consulado: "Só no ano passado diminuiu de 18 para 14 e isto surge em perfeita contradição com o número de portugueses no Luxemburgo, que está a aumentar".
"Atualmente, o consulado já atende apenas 70 pessoas por dia e quase outras tantas voltam para trás e têm de regressar outro dia", disse à Lusa.
José Cesário admite que se tenham reformado alguns funcionários, que "vão sendo substituídos progressivamente", mas lembrou que "há uma política de redução dos funcionários da administração pública, a que os consulados não escapam".
E sublinhou que "o consulado do Luxemburgo não é dos consulados com maior número de atos por funcionário". "Bem pelo contrário: há consulados que têm o dobro do trabalho por funcionário do que tem o Luxemburgo", afirmou.
O conselheiro das Comunidades Portuguesas acusou ainda o Estado Português de estar a violar a legislação luxemburguesa em matéria de salário mínimo e de indexação dos salários à inflação, no caso de cerca de metade dos funcionários do consulado, que têm contratos locais.
"Entende o Governo português que isso tem a ver com as medidas de austeridade, mas as medidas de austeridade têm de ser aplicadas aos funcionários que dependem do Ministério, mas quando contrata pessoas localmente, tem de se submeter à legislação local" disse.
Eduardo Dias adiantou que a questão já foi colocada ao ministro do Trabalho e ao primeiro-ministro luxemburgueses e "ambos confirmaram que o consulado está em situação de ilegalidade", tendo o encarregado de negócios da Embaixada, Rui Correia, sido chamado ao Ministério dos Negócios Estrangeiros do Luxemburgo para prestar esclarecimentos.
"Portugal começa a ficar com uma má imagem, de mau pagador e de desrespeito pela legislação do país", disse, acrescentando que o sindicato luxemburguês OGBL está mesmo a preparar um processo em tribunal contra o Estado português.
O secretário de Estado remeteu comentários a estas acusações para o Ministério dos Negócios Estrangeiros, responsável pelos pagamentos dos salários, mas a Lusa não conseguiu até ao momento obter uma reação.
(LUSA)

Bióloga portuguesa descobre quatro novas espécies de insectos na gruta mais profunda do mundo

Numa época de crise económica profunda, com os jornais e os noticiários televisivos a debitarem diariamente más notícias, o que nos tem conduzido a uma espécie de depressão colectiva, achei por bem falar-vos de uma das boas notícias que nos chegaram nos últimos tempos mas que andam por aí diluídas e que quase passam despercebidas entre as desgraças do costume.

Uma portuguesa, Sofia Reboleira, 31 anos, investigadora do Departamento de Biologia da Universidade de Aveiro, integrou a expedição ibero-russa Cavex que, no Verão de 2010, explorou a gruta natural mais profunda do Mundo, a Krubera-Voronia, na Abcásia (Norte da Geórgia, perto do Mar Negro).

A equipa de cientistas e espeleólogos descobriu, a quase dois mil metros de profundidade, quatro novas espécies de artrópodes (calêmbolos), insectos primitivos sem olhos e sem asas. Os resultados foram tornados públicos no final de Fevereiro na revista « Terrestrial Arthropod Reviews ».

Quinhentos anos depois de um grupo de destemidos navegadores portugueses terem deixado as margens seguras do rectângulo e se lançarem para além do fim do mundo, e prendarem o planeta com uma nova geografia e novos povos, uma portuguesa aventurou-se num dos limites extremos e mais perigosos do planeta para ajudar nesta descoberta notável. E Sofia fê-lo a seus próprios custos, o que torna o seu feito ainda mais meritório. Sofia diz que ainda há muito por explorar na gruta de Krubera-Voronia e que planeia lá voltar em 2013.

A última fronteira pode até ser o espaço, mas temos muito por descobrir no nosso próprio planeta, das grutas mais recônditas das entranhas da crosta terrestre às fossas mais profundas e misteriosas dos oceanos que, com certeza, nos reservam ainda muitas surpresas.

domingo, 11 de março de 2012

Portugal Pop, pela terceira vez no Luxemburgo

Um dos melhores momentos do 3° Portugal Pop ontem, na Kulturfabrik, em Esch/Alzette (Luxemburgo): Zé Manel "Darko" com "Define Joy". Grande voz, grande talento, um artista com muito, muito poencial ainda para dar à música portuguesa! Foi para mim uma revelação!




Adelaide Ferreira e Miguel Ângelo: grandiosos e únicos, como sempre nos habituaram. Banda In/Out, respect, grande guitarrista e grande baterista! Portugal Pop 2012, soube a pouco...

sábado, 10 de março de 2012

Cozinheiro luso-francês merece elogios da revista "Le Point"

Depois de se ter sido distinguido com o Prémio de Melhor Operário de França em 2011, o cozinheiro luso-descendente Christophe Pacheco tem vindo a destacar-se no restaurante cinco estrelas do Relais & Châteaux  (hotel-castelo) da localidade de La Clusaz (Haute Savoie, Rhône-Alpes, perto da fronteira suíça).

Pacheco formou-se com o chefe francês Joël Robuchon (18 estrelas no Guia Michelin), trabalhou no restaurante "Aux Armes de France", em Corbeil-Essones (a 30 km a sudeste de Paris) e mereceu um artigo na revista Le Point, de 28 de Fevereiro.

A revista diz que os pratos agri-doces e as "alianças maliciosas de sabores" são já uma das marcas de referência do jovem chefe luso-francês. A publicação cita como exemplos as Coxas de Rã ‘en folie’ panadas, com creme de castanhas, alho preto e ‘raviola’ de beterraba e couve verde; ou o Pregado na Brasa com Manteiga de Verbena e o seu Risotto de Fregola Sarda; ou ainda o Entrecosto « Dry Aged » com salsa, flôr de sal, pimenta aromática e croquettes.

Dá vontade de dar um saltinho até La Clusaz...

sexta-feira, 9 de março de 2012

EDITORIAL: O eixo da terra está a mudar

O eixo da Terra está a mudar


Li algures na imprensa portuguesa que, muito embora os portugueses não apreciem o epiteto de "país periférico" que Bruxelas dá a Portugal, o facto é que é isso mesmo que o nosso rectângulo é, "que fazer", resignava-se o jornalista? E acrescentava que isso explica a condição de "subúrbio" a que o nosso rectângulo está votado. Ou seja, a culpa da crise que nos caiu em cima não é nossa, é do lugar que herdámos da geografia (!?).

Como se o centro de decisões e de negócios nunca pudesse ter sido Lisboa e – inverta-se os papéis –, a Alemanha o "hinterland" europeu ou o "arrière-pays" continental. Estas duas palavras não têm infelizmente uma boa tradução em português, pois o seu equivalente "o interior" ("país real" é uma invenção da TV-reality show dos anos 90!), não comporta o significado de "afastado", "esquecido, lá para trás", que os termos alemão e francês abrangem. Felizmente, a História não dá razão aos epitetos que nos cognominam e a geografia não é uma fatalidade. Lisboa já foi dona de metade do Mundo e o seu "handicap" de hoje – a periferia –, foi na Era dos Descobrimentos a sua mais-valia. E exemplos como este abundam através dos tempos. Babilónia ou a Pérsia foram já as regiões mais civilizadas do mundo, depois em declínio e esquecidas durante milénios, foram novamente trazidas para o tabuleiro mundial graças ao petróleo. Como é que Alexandre Magno conseguiu fazer da sua encravada Macedónia o centro de um império que se estendeu através de um quarto do globo até às portas da Índia? Como é que uma cidade como Roma construiu um império que ia da África do Norte ao Médio Oriente e da Alemanha à Escócia? Também a América Central e do Sul viram proliferar as civilizações mais avançadas do seu tempo quando a Europa atravessava "os séculos escuros".

Lisboa já foi o rosto com que a Europa fitou o mundo, recorda-nos o nosso oráculo nacional Fernando Pessoa, na sua "Mensagem". Será que percebemos bem a mensagem? E se o "recado" de Pessoa fosse "Mens Ag(itat Mol)em", ou seja, que o espírito comanda o corpo, expressão repescada à "Eneida" de Virgílio. Mas se a mente comanda a matéria, Deus quer, o Homem sonha e a obra nasce, então a inteligência não se deixa ditar desditas pela geografia. Até porque a geografia "acabou" e o homem hoje sabe ser ubíquo.

É armado desta sabedoria, sem ligar a fatalismos bacocos e desculpando-se com a "soi-disant" geografia, que o Dubai, por exemplo, sabendo próximo o fim do reino do ouro negro, está a fazer nascer hoje a megalópole de amanhã, das areias inóspitas do deserto e bairros inteiros em cima de ilhas artificiais. Do mesmo modo, o Luxemburgo, este improvável país que se quis independente sem que ninguém no século XIX acreditasse na sua perenidade, nem mesmo os luxemburgueses, soube antecipar o fim da siderurgia e lançar desde os anos 60 os pilares de outras economias (os serviços, a praça financeira, as telecomunicações, a logística) que asseguraram o futuro. E o Ducado agrícola das hortas de subsistência de há dois séculos soube atravessar as convulsões hegemónicas e geo-económicas do século XX, e tornar-se um país política e economicamente estável, um burgo centripeta, que atrai populações e empresas dos quatro cantos da Europa e do Mundo.

Saber governar é saber prever. Qualidade que têm tido alguns (friso alguns) governantes luxemburgueses (até agora !) e que tem faltado singularmente à maioria dos políticos portugueses.

Onde está o futuro de Portugal? Quanto a mim, acredito que a língua é nossa melhor embaixadora, que os caminhos que abrimos pelos mares e nos levaram ao achamento do Brasil, a África e até Timor, são a rota instintiva a seguir para nos projectarmos no futuro e num planeta cujo eixo está a mudar. O eixo da Terra está a mudar, mas não é o fim do Mundo.

Há muito que se previa que o centro económico do planeta iria mudar-se do Atlântico para o Pacífico. Mas era uma leitura enviesada. A China é hoje a potência mundial óbvia, mas a América do Sul (e não apenas o Brasil), a Índia e África prefilam-se. O eixo não está a girar do Atlântico para o Pacífico, antes está a mudar de hemisfério, do Norte para o Sul.

Quando entendermos isso, saberemos como sair da actual crise e criar uma nova era de prosperidade. Não só Portugal, mas a Europa. Portugal tem que, hoje mais do que nunca, fortalecer os laços que teceu graças às suas Descobertas. Talvez assim Portugal se cumpra, como sonhou Pessoa. Quanto à Europa, não se pode fechar em fortaleza, tem que abrir-se ao Mundo, ou está destinada a que esses povos um dia lhe virem as costas. E se num futuro não tão longíquo a Europa demograficamente exangue precisar dos africanos? Ou se os europeus quiserem emigrar para a África vizinha, esse gigantesco território riquíssimo, que há-de tornar-se no continente emergente, e os africanos não quiserem lá os "refugiados" do velho continente ? A Europa não pode declinar em subúrbio flatulento da nova geografia mundial. Porque a geografia não é uma fatalidade, mas uma oportunidade.

O eixo da Terra está inelutavelmente a mudar mas, e nós, saberemos acompanhar o movimento da tectónica económica ?


José Luís Correia
in CONTACTO, 07/03/2012

quarta-feira, 7 de março de 2012

O eixo da Terra está a mudar

O eixo da Terra está a mudar

Li algures na imprensa portuguesa que, muito embora os portugueses não apreciem o epiteto de "país periférico" que Bruxelas dá a Portugal, o facto é que é isso mesmo que o nosso rectângulo é, "que fazer", resignava-se o jornalista? E acrescentava que isso explica a condição de "subúrbio" a que o nosso rectângulo está votado. Ou seja, a culpa da crise que nos caiu em cima não é nossa, é do lugar que herdámos da geografia (!?).

Como se o centro de decisões e de negócios nunca pudesse ter sido Lisboa e - inverta-se os papéis -, a Alemanha o "hinterland" europeu ou o "arrière-pays" continental. Estas duas palavras não têm infelizmente uma boa tradução em português, pois o seu equivalente  "o interior" ("país real" é uma invenção da TV-reality show dos anos 90!), não comporta o significado de "afastado", "esquecido, lá para trás", que os termos alemão e francês abrangem. Felizmente, a História não dá razão aos epitetos que nos cognominam e a geografia não é uma fatalidade. Lisboa já foi dona de metade do Mundo e o seu "handicap" de hoje - a periferia -, foi na Era dos Descobrimentos a sua mais-valia. E exemplos como este abundam através dos tempos. Babilónia ou a Pérsia foram já as regiões mais civilizadas do mundo, depois em declínio e esquecidas durante milénios, foram novamente trazidas para o tabuleiro mundial graças ao petróleo. Como é que Alexandre Magno conseguiu fazer da sua encravada Macedónia o centro de um império que se estendeu através de um quarto do globo até às portas da Índia? Como é que uma cidade como Roma construiu um império que ia da África do Norte ao Médio Oriente e da Alemanha à Escócia? Também a América Central e do Sul viram proliferar as civilizações mais avançadas do seu tempo quando a Europa atravessava "os séculos escuros".

Lisboa já foi o rosto com que a Europa fitou o mundo, recorda-nos o nosso oráculo nacional Fernando Pessoa, na sua "Mensagem". Será que percebemos bem a mensagem? E se o "recado" de Pessoa fosse "Mens Ag(itat Mol)em", ou seja, que o espírito comanda o corpo, expressão repescada à "Eneida" de Virgílio. Mas se a mente comanda a matéria, Deus quer, o Homem sonha e a obra nasce, então a inteligência não se deixa ditar desditas pela geografia. Até porque a geografia "acabou" e o homem hoje sabe ser ubíquo.

É armado desta sabedoria, sem ligar a fatalismos bacocos e desculpando-se com a "soi-disant" geografia, que o Dubai, por exemplo, sabendo próximo o fim do reino do ouro negro, está a fazer nascer hoje a megalópole de amanhã, das areias inóspitas do deserto e bairros inteiros em cima de ilhas artificiais. Do mesmo modo, o Luxemburgo, este improvável país que se quis independente sem que ninguém no século XIX acreditasse na sua perenidade, nem mesmo os luxemburgueses, soube antecipar o fim da siderurgia e lançar desde os anos 60 os pilares de outras economias (os serviços, a praça financeira, as telecomunicações, a logística) que asseguraram o futuro. E o Ducado agrícola das hortas de subsistência de há dois séculos soube atravessar as convulsões hegemónicas e geo-económicas do século XX, e tornar-se um país política e economicamente estável, um burgo centripeta, que atrai populações e empresas dos quatro cantos da Europa e do Mundo.

Saber governar é saber prever. Qualidade que têm tido alguns (friso alguns) governantes luxemburgueses (até agora !) e que tem faltado singularmente à maioria dos políticos portugueses.

Onde está o futuro de Portugal ? Quanto a mim, acredito que a língua é nossa melhor embaixadora, que os caminhos que abrimos pelos mares e nos levaram ao achamento do Brasil, a África e até Timor, são a rota instintiva a seguir para nos projectarmos no futuro e num planeta cujo eixo está a mudar. O eixo da Terra está a mudar, mas não é o fim do Mundo.

Há muito que se previa que o centro económico do planeta iria mudar-se do Atlântico para o Pacífico. Mas era uma leitura enviesada. A China é hoje a potência mundial óbvia, mas a América do Sul (e não apenas o Brasil), a Índia e África prefilam-se. O eixo não está a girar do Atlântico para o Pacífico, antes está a mudar de hemisfério, do Norte para o Sul.
  
Quando entendermos isso, saberemos como sair da actual crise e criar uma nova era de prosperidade. Não só Portugal, mas a Europa. Portugal tem que, hoje mais do que nunca, fortalecer os laços que teceu graças às suas Descobertas. Talvez assim Portugal se cumpra, como sonhou Pessoa. Quanto à Europa, não se pode fechar em fortaleza, tem que abrir-se ao Mundo, ou está destinada a que esses povos um dia lhe virem as costas. E se num futuro não tão longíquo a Europa demograficamente exangue precisar dos africanos? Ou se os europeus quiserem emigrar para a África vizinha, esse gigantesco território riquíssimo, que há-de tornar no continente emergente, e os africanos não quiserem lá os "refugiados" do velho continente ? A Europa não pode declinar em subúrbio flatulento da nova geografia mundial. Porque a geografia não é uma fatalidade, mas uma oportunidade.

O eixo da Terra está inelutavelmente a mudar mas, e nós, saberemos acompanhar o movimento da tectónica económica ?

José Luís Correia
(in CONTACTO, 07.03.2012)

terça-feira, 6 de março de 2012

Smooth FM, a Radio Trójka portuguesa, banda sonora das minhas viagens imóveis

A Jessica, que anda sempre nas explorações musicais e em busca de novas sonoridades, descobriu há uns dias a lisboeta Smooth FM, que centra a sua programação na música smooth jazzy, soul, blues, bossa nova, e se define a si mesma como uma rádio para um auditório "adulto, sofisticado e descontraído".

A novel rádio passa desde "Count Bassie a Diana Krall, passando por Tony Bennett, Elvis Costello, Ray Charles, Miles Davis, Norah Jones e, obviamente, Frank Sinatra", exemplifica um comunicado da estação.

A nova rádio emite desde Lisboa na mesma frequência que a antiga Best Rock, em 103.0 FM (e na Região Centro em 92,8), mas pode também ser ouvida na internet aqui.


A Smooth abriu em Setembro de 2011 e faz parte do grupo Media Capital, que inclui emissoras como a Rádio Comercial, a M80 e a Cidade FM. À excepção da última, são rádios que já ouvíamos incidentalmente, a primeira porque somos fãs de Nuno Markl e Ricardo Araújo Pereira, a segunda pela música dos anos 70, 80 e 90 que passa.

Banda sonora das minhas viagens imóveis

Depois da manhã a ouvir o álbum "Swing in the films of Woody Allen", passámos a tarde de sábado ao som da Smooth e a ler. E que bem que fez.

A Smooth fez-me imediatamente pensar na saudosa Radio Trójka (Rádio Três) de Varsóvia, que descobri em Agosto de 2003 e que continuou a acompanhar-me durante vários anos.

Uma noite deixei o velho transistor ligado e passei as horas acordando e adormecendo ao som da Trójka, da voz apaziguadora dos locutores de uma língua que sempre me pareceu familiar e com semelhanças estranhas ao português (pelo menos, ao meu ouvido), mesmo se só ia percebendo uma palavra em cada três. E tudo isso misturava-se harmoniosamente aos barulhos da noite varsóvica que se espraiava lá fora.

A Trójka (que nessa altura passava só mesmo jazz, hoje inclui rock e música alternativa) tinha o dom de me acalmar e de me fazer viajar mentalmente,

janela fora,

até a torre do Palácio da Cultura e da Ciência, até à avenida do Novo Mundo (adoro esta toponímia), até à palmeira em plástico da avenida De Gaulle, até à "rynek" (praça do mercado) reconstruída pedra à pedra da velha Varsóvia, pelos jardins do palácio de Wilanów (a Versalhes polaca), sobre as águas da Vístula, seguindo a corrente para Norte, até às ruas de Gdansk, pelas praias bálticas de Gdynia. Depois, rumo a sul, até à lindíssima "rynek" colorida de Poznan, pelo jardim japonês de Wroclaw, pelas ruas de Wolsztyn onde cruzei Koch e o seu bacilo, pela auto-estrada hitleriana aos solavancos até à Alta Silésia e Katowice, pelo santuário de Czestochowa (a Fátima polaca), pelo majestoso parque florestal de Ojców, pelas minas de sal de Wieliczka, pela romântica Zakopane, no sopé dos Tatras (Cárpatos), com as suas incríveis igrejas construídas totalmente em madeira,

e, finalmente, até ao bairro judeu da lindíssima Cracóvia, onde o jazz elege lugar cativo.

Eram as minhas viagens interiores de itinerários exteriores já percorridos e pelos quais me apaixonei. Também graças à Radio Trójka, porque compôs a banda original sonora desse meu filme.
Gydnia (costa do mar Báltico)
 
Praça central de Wroclaw, uma das outras cidades pela qual me apaixonei

A lindíssima Cracóvia, que me seduziu
 
A romântica Zakopane, no sopé dos Cárpatos (Tatras)

Fotos: Wikipédia










segunda-feira, 5 de março de 2012

Contra o "imperialismo" do romance

Capa do livro "Comme un roman", de Daniel Pennac
"Fazer do romance o alfa e o ómega da criação literária é um tique, é mesmo um grande toc [traumatismo obsessivo compulsivo, n.d.T.], que nos separa de um imenso património literário. Não é uma crítica que faço ao romance, mas à nossa consciência literária desde o princípio do século XX. Estamos obnubilados pela ideia que literatura é a mesma coisa que romance", denuncia o crítico literário francês Gérard Génette.

O teórico da literatura evoca a aversão que Paul Valéry tinha pelo romance e como Albert Thibaudet criticou o "imperialismo" do romance em meados do século passado. E, como se restassem dúvidas, Génette recorda que muitos autores e não de somenos importânica - Homero, Virgílio, Shakespeare ou Racine - não eram romancistas, mas poetas ou dramaturgos.

"Aux Confins de la Littérature", 
in Télérama (22/02/2012)

Portugal bisa na Medalha de Arquitectura Alvar Aalto

Em Fevereiro, Paulo David tornou-se o segundo arquitecto português a arrecadar a Medalha Alvar Aalto pela sua contribuição para a arquitectura.

O prémio, atribuído de forma intermitente desde 1967, pelo Museu de Arquitectura da Finlândia e pela Associação Finlandesa de Arquitectos, já distinguiu 11 arquitectos, mas apenas os portugueses - Siza Vieira já vencera este prémio em 1988 - e os dinamarqueses (1982 e 2009) bisaram.

Paulo David nasceu no Funchal (1959), formou-se na Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa (1989), trabalhou com os arquietctos Gonçalo Byrne e João Luís Carrilho da Graça, antes de regressar ao Funchal (1996), onde estabeleceu o seu próprio gabinete (2003).

Uma das obras de Paulo David:
Casa das Mudas (Calheta, Madeira)
São obras suas o Centro de Artes Casa das Mudas (Calheta, Madeira), o Restaurante Salinas (Câmara de Lobos), o Pavilhão do Vulcanismo (São Vicente, Madeira) ou o Passeio Marítimo das Salinas (Câmara de Lobos).

Alvar Aalto (1898-1976)
Esta medalha é atribuída em honra de Alvar Hugo Henrik Aalto (1898-1976) arquitecto, desenhador, urbanista e designer finlandês, adepto do funcionalismo e da arquitectura orgânica. É responsável, entre outras obras, pela Villa Mairea (Noormarkku), Palácio Finlandia (Helsinquia) e pelo campus da Universidade Técnica da capital finlandesa.

Receberam a Medalha Alvar Aalto os seguintes arquitectos: Alvar Aalto (1967) ; Hakon Ahlberg (1973, Suécia); James Stirling (1978, Reino Unido); Jørn Utzon (1982, Dinamarca); Tadao Ando (1985, Japão); Álvaro Siza Vieira (1988, Portugal); Glenn Murcutt (1992, Austrália); Steven Holl (1998, EUA); Rogelio Salmona (2003, Colômbia); Tegnestuen Vandkunsten (2009, Dinamarca); e Paulo David (2012, Portugal). 

domingo, 4 de março de 2012

Pa-pa-pa-pa-Papageno

Fui ver no sábado à noite à Abadia de Neumünster, no Grund, "A Flauta Mágica" de Wolfgang Amadeus Mozart.

Adorei a performance vocal da soprano portuguesa Rita Matos Alves no papel de Pamina, que está a fazer carreira em Bruxelas e em boa hora participou neste projecto. Achei-a comovente, viva, engraçada, uma verdadeira intérprete em suma e dona de uma portentosa e bonita voz.

E foi graças à Rita que Pamina brilhou mais que Tamino, interpretado pelo tenor Paul Feitler. Achei-o demasiado imóvel, formal, apagado. Preferi-o quando fez de Anás no musical "Jesus-Christ Superstar", que passou pelo palco do Kinneksbond, em Mamer, em Janeiro.

Gostei também da voz cristalina da soprano coloratura Noémie Sunnen como Rainha da Noite. Mas, penso que o desempenho do barítono Alexandre Poulis como Papageno arrebatou o público.

Uma palavra ainda para as três damas, Helen Smith (soprano), Anne Weishar (soprano) e Magali Weber (mezzo-soprano). Boas vozes, mas fiquei com a impressão que não sabiam mexer-se em palco, apesar do esforço do encenador que, penso, quis ser mais airoso que as encenações mais clássicas do género.

Um elogio ainda para a direcção musical e de cena dos três génios, interpretados aqui por Frances McDonald (soprano), Myriam Muller (soprano) e Irene Broz (mezzo-soprano). Gostei também da Papagena, a soprano Julie Calbete, apesar do seu aparecimento fugaz.

Achei as interpretações muito desiguais em geral, algumas muito boas vozes ao lado de outras menos boas, que destoavam e desequilibravam o conjunto.Infelizmente, penso que a acústica demasiado seca da Sala Robert Krieps foi madrasta com alguns artistas. Por exemplo, penso que Sarastro (o baixo Jean Bermes) é um bom cantor mas que a sala não lhe fez justiça. Em contrapartida, achei deplorável a interpretação do baixo Johannes Gülich, que fez de padre. Má voz, má interpretação e presença em palco divagante.

No entanto, acho que são excelentes estas iniciativas. Pela multiplicação se chegará à exclência. Parabéns ao Studio d'Opera do Luxemburgo, com direcção musical de Radu Pantea, encenação de Ionel Pantea e que contou na organização com outra portuguesa, Filomena Domingues.

 Uma experiência a repetir, com certeza. A ópera, não a sala!

Deixo-vos aqui dois excertos da mesma ópera, não com a companhia do Studio d'Opera do Luxemburgo (não encontrei vídeo na internet), mas com a Ópera de Paris, numa das encenações mais fabulosas da obra de Mozart, em 2001. Dois dos meus momentos preferidos

sexta-feira, 2 de março de 2012

Ler

Lire LER (2 Março 2012) Foto: JL
Foire du Livre de Bruxelles Foto: JLC